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domingo, 22 de janeiro de 2023

Madalena Castro (Canteiro de Trovas)


 A poesia me faz
pelas nuvens viajar,
só com ela eu sou capaz
de ir ao fundo do mar.
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A vida é feito uma flor
que vai se despetalar,
regue-a sempre com amor
para não vê-la murchar.
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A vida é grande ciranda
e cada vez mais rodada,
Uma hora a gente manda
Na Outra a gente é mandada.
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Cirandeira, cirandeira
venha logo cirandar,
aproveite a brincadeira
hoje é noite de luar.
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Das flores do meu jardim,
só uma eu gosto mais dela,
é o pequenino jasmim
que enfeita a minha janela.
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Doce e gostosa lembrança
eu guardo no coração,
do meu tempo de criança
vendo o luar do sertão.
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Estou sentindo saudade
dos beijos que mamãe dava,
quando eu bastante à vontade
no seu colo me deitava.
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É tão grande a singeleza
dos versos de um trovador,
e tem muito mais beleza
quando ele fala de amor.
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Eu gosto de contemplar
o luar lá do sertão,
pois ele me faz lembrar
do meu querido torrão.
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Eu levo o tempo sorrindo
contemplando a natureza,
só assim vou extinguindo
as mazelas da tristeza.
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Eu não sou nenhuma artista
gosto de ler, de escrever,
por sorte sou cordelista
isto eu faço com prazer.
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Eu queria ser doutor.
mas mudei de opinião,
passei a ser trovador,
que me traz mais emoção.
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Foi na voz de um trovador
que lá da minha janela,
escutei versos de amor
pra sua amada tão bela.
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Foi no carnaval passado
que meu grande amor perdi,
não sei quem foi o culpado…
só sei que muito sofri.
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Gosto do Bloco das Flores
onde o lirismo irradia,
me faz lembrar dos amores
que conheci na folia.
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Igualzinho ao vendaval
o nosso amor começou,
terminado o carnaval
este amor se evaporou.
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Mamãe foi a flor mais bela
que brotou no meu jardim,
bem delicada e singela
que o Senhor mandou pra mim.
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Mando daqui meu abraço
com ternura e nostalgia,
dos encontros no terraço
que a gente sempre fazia.
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Me recordo com saudade
do meu tempo de criança,
eu tinha felicidade,
amor e muita esperança.
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Na noite em que está brilhando
o luar do meu sertão,
minha mente sai voando
e me traz inspiração.
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Nesta grande brincadeira
não dou bolas pra ninguém,
eu passo uma noite inteira
cirandando com meu bem.
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O frevo enlouquece a gente,
nos faz até delirar,
e neste delírio quente
nós frevamos a sonhar.
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O poeta expressa a dor
também expressa alegria,
faz declaração de amor
nos versos da poesia.
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O teu sorriso, meu bem
tem a graça de uma flor,
quando se abrindo ela vem
no jardim do nosso amor.
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Pode até fazer calor
o sol, meu corpo queimar,
mas por sentir tanto amor
não deixarei meu lugar.
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Quando estou com meu amor,
não vejo o tempo passar,
sinto-me igual ao condor
num largo espaço a voar.
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Que coisa boa, chegou
o verão tão esperado,
mas o sol quente deixou
meu rosto quase queimado.
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Recife, nunca esqueci
do teu passado de glória,
de tudo que descobri
nos vários livros de história.
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Saudade bate e machuca,
nunca respeita o sujeito,
deixa a cabeça maluca,
se aloja dentro do peito
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Saudade é faca que corta
sem ter gume pra cortar,
e bate na sua porta
sem você nem esperar.
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Saudade é fogo que queima
machucando o coração,
e só por maldade teima
em trazer recordação.
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Ser uma grande cantora
era tudo o que eu queria,
findei sendo professora
de cordel e poesia.
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Sou mulher e sou feliz,
não devo nada a ninguém,
de tudo um pouco já fiz
e vou muito mais além.
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Todas mulheres são flores
vindas da Mãe Natureza,
despertadoras de amores
por terem graça e beleza.
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Todo o sertão agradece
ao ver a chuva caindo,
seu povo reza uma prece
e vai pro campo sorrindo.

Fonte:
https://ubt-recife.blogspot.com/

domingo, 11 de dezembro de 2022

Manoel Monteiro (Canteiro de Trovas)

 

Adoro a Virgem Maria;
Maria ensinou-me a ler;
outra roubou-me a alegria
e tu me fazes morrer.
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Ao vê-la, em vistoso templo,
fazendo o pelo-sinal,
fui imitar-lhe o exemplo,
ficou me querendo mal.
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Aprendi, cheio de ardor,
pensando no paraíso,
o A B C de meu amor
na carta de teu sorriso.
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Costuma-te a ser jocundo,
coração, não desesperes:
Hás de viver neste mundo
sem entender as mulheres.
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De ternas flores mimosas
terno leito vou fazer,
embora possa entre as rosas
teu corpinho se esconder.
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Filhinha, toma cuidado!.,.
não largues mais tua cruz,
que o demônio anda trajado
nas roupagens de Jesus.
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Fiz inveja a muita gente
no dia em que andei contigo...
Até um lírio inocente
mostrou-se meu inimigo.
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Fui confessar-me e na grade
contei meus crimes e o teu,
se é bonita... disse o frade,
e rindo me absolveu.
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Maio surgiu entre flores.
Tudo ri no mês de maio.
Só eu, senhora, desmaio*
pelo caminho das dores,
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Meu peito sofre calado,
nunca chorou nem gemeu,
pois se o fizer, desgraçado,
sua fortuna perdeu.
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Milagres - terra de Olinda
quando o sol no azul desmaia,
é corpo de moça linda
deitado à beira da praia.
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No dia em que tu fizeste
a primeira comunhão,
a hóstia do amor me deste,
guardei-a em meu coração.
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Nos olhos não tenho pranto,
Lucília o pranto levou.
Pela morta chorei tanto
que a pobre fonte secou.
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Os dobres causam-me espanto!
Antes de morto previno:
se houver dobres me levanto
e quebro as cordas do sino.
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Pois da vida nos escombros
minha esperança me diz:
há de cair de teus ombros
este manto de infeliz.
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Seguindo junto ao teu seio,
vendo teu rosto sem véu,
julguei-me um santo em passeio
pelas estradas do céu.
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Somos cinco retirantes
pelas estradas reais!
Pobres dos nossos descantes,
descantes pobres de mais! ...
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Suporto negro ciclício,
mas não conto meu desgosto
que, pelos traços do rosto,*
todos lerão meu suplício
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Todo moço que for pobre,
faça o que eu faço também
para quem mágoas descobre
só desprezo o mundo tem.
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Um só desejo na vida
eu sinto-me perseguir:
é nos teus braços, querida...
pousar a fronte e dormir.
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Vem aos meus braços abertos,
desce do teu quinto andar,
que os anjos do céu, espertos,
procuram te namorar.
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Vivo ausente de Palmares,
feliz terra onde nasci.
Eu lá não senti pesares,
vim padecer foi aqui.
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* Na época não era obrigatório rimar o 1. com o 3. verso, somente foi normalizada esta obrigatoriedade com a fundação da União Brasileira de Trovadores, em 1966.
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Fonte:
Adelmar Tavares et al. Descantes. Recife/PE: Tipografia da Imprensa Oficial. 1a. edição publicada em 1907.

quinta-feira, 5 de maio de 2022

Moreira Cardoso (Caderno de Trovas)



Contemplando as suas águas
a saudade vem-me então,
Capibaribe de mágoas
dentro do meu coração.
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De tanto amar-te, Maria,
já não comporto este amor.
Tão grande é minha alegria
que eu invejo os que têm dor!...
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De verme tu me chamaste
por eu ter-te contemplado.
Tu mesma me desculpaste,
inda te fico obrigado...

E ante o insulto fico inerte,
pois se olhei-te, assim de rastros,
é que o verme pra ser verme
precisa olhar para os astros.
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Do amor a fera agonia
obriga a quem tem amor,
a ver na dor - alegria -
e a ver n'alegria dor.
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Do que amantes hão contado
não se duvides porque
olhares de namorado
veem coisas que ninguém vê.
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Lua, pandeiro de prata,
gemendo às mãos do infinito,
seja, ao fim da serenata,
pra ti meu último grito.
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Maria, foge aos luares,
que em noites de lua cheia,
desata a lua os pesares
quando no espaço passeia.
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Não sei, tão grande parece
a tristeza que padeço,
se a tristeza me entristece
ou se à tristeza entristeço! ...
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Não tendo sal, a comida
não presta a qualquer pessoa;
precisa ter sal a vida,
pra que a vida seja boa.
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No coração, disse um santo,
origens a mágoa tem.
Se vem da mágoa o teu pranto,
tua mágoa donde vem?
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O céu é fita azulada;
e a lua, que em cismas fito,
é medalha pendurada
no pescoço do infinito.
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O pesar tem tal voragem
que o prazer não tem valor,
não sendo mais que a passagem
de uma dor para outra dor.
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O rio Capibaribe,
que é rio do meu país,
quando aos luares se exibe
sempre me faz infeliz.
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Os corações namorados
devem a lua evitar:
são tanto mais desgraçados
quando mais lindo o luar!
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Por mais que tentes, senhora,
tirar-me sempre a esperança,
mais a paixão me devora
e mais tormentos me lança.

Pois este amor que me inspira
é cova, mal comparando,
que tanto mais se lhe tira
tanto maior vai ficando.
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Pra minha tristeza crua,
busco amparo em que me açoite,
tomando banhos de lua
dentro do tanque da noite.
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Quando tu choras, me espanto
e os meus olhos se enchem d'água!
Vem a magoa de teu pranto,
não vem teu pranto da mágoa.
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Que calor em teus olhares!...
Em teus lábios, que vulcão!...
Porém, para meus pesares,
que gelo em teu coração!...
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Quem espera não é santo,
pois eu tanto te esperei
que assim, de esperar-te tanto,
desesperado fiquei.
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Que no amor tudo se negue
pois se uma alma amorosa
pode ver a dor, alegre,
e a ventura, dolorosa.
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Se o nosso pranto é salgado,
nosso pranto não faz mal,
quem nunca tiver chorado
não presta, pois não tem sal.
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Tenho sofrido bastante...
Porém, quando penso em ti,
da dor me vejo distante.
Nem me lembro que sofri.

Fonte:
Adelmar Tavares et al. Descantes. Recife/PE: Tipografia da Imprensa Oficial. 1a. edição publicada em 1907.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

Calazans Alves D’Araújo (1902 - 1976)

Ao ver-te colhendo flores,
tive esse desejo vão:
transformar-me numa flor,
para estar em tua mão.
- - - - - –

É meu peito uma gaiola
vazia, sem passarinho.
Ah! Se eu pudesse, menina,
guardar nele o teu carinho!
- - - - - –

Este nosso velho mundo
já não está prestando mais:
rapaz querendo ser moça…
moça a querer ser rapaz...
- - - - - –

Eu sou como aquele ramo
da roseira, que ficou
muito triste, sem a rosa
que mão perversa arrancou.
- - - - - –

Eu sou seu, você é minha,
somos os dois – galho e flor
juntinhos, amando e rindo,
felizes no nosso amor.
- - - - - –

Invejei aquele feio
e miserável mendigo
que te pediu uma esmola…
(e eu nunca falei contigo!)
- - - - - –

Nasci no Brasil: me orgulho
de ser daqui do Nordeste,
onde as mulheres são lindas
e os homens cabras-da-peste.
- - - - - –

O beijo da nossa linda
morena pernambucana,
é gostoso como o mel
feito da cana-caiana.
- - - - - –

O vento desfolha as flores,
jogando-as no pó do chão.
Fez assim com os meus amores
a cruel ingratidão.
- - - - - –

Quando Ziza por mim passa,
eu me ponho a suplicar:
- Nossa Senhora da Graça
não deixe Ziza casar…
- - - - - –

Quanto mais galopa o tempo,
corre veloz, vai-se embora,
mais meu coração te ama,
busca e quer, muito te adora.
- - - - - –

Que desejo extravagante
este do meu coração:
querer ser o travesseiro
onde dorme Conceição!
- - - - - –

Quem fez o céu tão bonito,
a floresta, o campo, o mar,
não devia ter-me feito
para sofrer e chorar.
- - - - - –

Que tenho sido na vida?
No mundo, que tenho sido?
— Um velho barco perdido
numa enseada esquecida...
- - - - - –

São meus olhos dois mendigos,
dois miseráveis plebeus,
pedindo, ao bater-te à porta,
uma esmola aos olhos teus.
- - - - - –

— Tão longe! — disseste olhando
o céu. Eu disse: Tão perto!...
Falei do céu de teus olhos,
alegrando meu deserto...
- - - - - -

Tu gostas de minhas trovas,
eu gosto do teu olhar.
Foi por causa dos teu olhos
que eu aprendi a trovar.
 - - - - - –

Vendo da mulher o riso
Diz a feroz onça preta:
- Não torço esse meu sorriso
por essa horrível careta.

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Calazans Alves D'Araújo nasceu em 1902 e faleceu em 1976. Residia em Catende/PE. Poeta e trovador. Professor em diversas cidades do Pernambuco. Publicou em 1961 um livro intitulado "Ao Doce Embalo da Rede", trovas e em 1973, “Flauteio do Sabiá”.

Fontes:
– Aparício Fernandes (org.). Trovadores do Brasil. 2. Volume. RJ: Ed. Minerva.
– Calazans Alves D’Araújo. Ao doce embalo da rede.

quinta-feira, 13 de abril de 2017

Bastos Tigre (1882 - 1957)


1
Aliança! algema divina,
a mais doce das prisões;
uma prisão pequenina
que encerra dois corações.
2
Ama a tua arte. Por ela
faze o bem: ama e perdoa.
A bondade é sempre bela,
a beleza é sempre boa.
3
AMBIÇÃO – De olhar agudo,
marcha, firme, aos seus ideais;
quer pouco, que mais, quer tudo;
se tem tudo ainda que mais.
4
Amizades são incertas.
Ao fazê-las, desconfia:
esta mão que agora apertas
bem pode espancar-te um dia.
5
Ao te ver fico mudo
mas mesmo assim, sou feliz.
Pois meu olhar te diz tudo
que a minha voz não te diz.
6
A Saudade é calculada
por algarismos também:
distância multiplicada
pelo fator “querer bem”.
7
Como infeliz é esta gente
que pensa que ser feliz
é não dizer o que sente
e não sentir o que diz!
8
Como será compreendida
a incongruência da sorte?
Pois há quem nasça sem vida
e ninguém morre sem morte.
9
Com tuas frias maneiras
eu não me incomodo, pois,
embora tu não me queiras,
meu amor vale por dois.
10
Cora a moral, fica rubra,
ante a imodéstia; pois, certo,
é feio que se descubra
o que deve ser coberto.
11
Da morte a sentença imprensa
trazemos desde o nascer:
assim que a vida começa
começa a gente a morrer.
12
Da vida o relógio rode
até que a corda se acabe…
Em moço, nada se sabe;
em velho, nada se pode… 
13
Depois de uma vida airada,
ao céu quis ir sem licença.
São Pedro pede-lhe a entrada-
e o morto, arrogante: – Imprensa!
14
Dinheiro não há que abrande
a dor que um peito magoa:
uma sorte é ” sorte grande”
outra coisa é ” sorte boa “.
15
Dos versos os mais diversos
já fiz: muita gente os lê…
Mas “poesia” há nos versos
que eu fiz pensando em você.
16
Elo de ouro! És a esperança
de horas risonhas e calmas! 
Felizes dos que, na aliança, 
acham a aliança das almas. 
17
Este velho batoteiro
quando a morte o trouxe cá,
ao ver a pá… do coveiro
foi dizendo: – bacará !
18
Eu, neste assunto de esmola
sem ambições me suponho:
estendo a minha sacola
peço um bocado de sonho…
19
Foi-me o amor, na mocidade,
um passatempo, comum:
tantas amei que, em verdade,
nunca tive amor nenhum.
20
Isto de amar considero
que ser amado requer.
E é por isso que eu não quero
querer a quem não me quer.
21
Jurar é falar a esmo,
é prometer sem pensar.
Juras não faças; nem mesmo
a jura de não jurar.
22
LIBERDADE – O cidadão 
livre, tem todo o direito
de fazer o que o patrão
acha que deve ser feito.
23
Maldigo quem te ache feia,
quem te ache bela também.
Quero mal a quem te odeia
e odeio a quem te quer bem.
24
Mente o peito que suspira?
O beijo é só falsidade?
Bendigamos a mentira
se ela é melhor que a verdade.
25
Meu amor enche-me a vida
e eu vivo feliz assim.
Basta que gostes, querida,
de ser querida por mim.
26
Morena de olhos castanhos,
teu encanto é a minha pena;
quem dera que olhos estranhos
te achassem feia, morena!
27
Na minha face estás lendo 
que a minha mágoa é sem fim; 
mas sinto alívio, sabendo 
que não sofres… nem por mim! 
28
Namorados. Para ouvi-los
faço, ao lado esforços vãos,
Como dois mudos, tranquilos,
falam somente com as mãos. 
29
Não te queixes! Sofrem quantos
vivem, na vida, a lutar;
se não secassem os prantos,
o mundo era todo um mar.
30
Neste mundo organizado 
de encontro à lei natural,
tudo que é bom é pecado
e o que é gostoso faz mal.
31
No amor não há diferença:
nós mentimos, vós mentis...
E, se um diz o que não pensa,
outro o que pensa não diz.
32
“O cão que ladra não morde”.
Permitam que nesta quadra
eu do provérbio discorde:
sim, não morde… enquanto ladra.
33
Olhos tristes ou risonhos
vejo entre a gente do povo
dos restos dos velhos sonhos
fabricando um sonho novo… 
34
O meu coração é o cofre
que as minhas dores contém
e as dores que você sofre
eu nele guardo-as também.
35
O poderoso ? Merece 
pena, lamento, piedade! 
Ah! se ele ao menos pudesse
mandar na própria vontade! 
36
Os sonhos tem saúde, entendo,
nasceram com boa estrela.
Pena é viverem sofrendo
pelo medo de perdê-la.
37
Para se amar é preciso,
de todo, o juízo perder;
ter-se a um tempo, amor e juízo
isto é que não pode ser.
38
Ponhamos no calendário
mais um santo português
milagroso Santo Hilário, 
que os fados mais belos fez.
39
Quando Deus fez Portugal
lá plantou com sua mão
na terra; vinha e trigal
e o fado no coração.
40
Quando em meus braços te aperto,
satisfaço o meu desejo: 
de mim te sinto tão perto, 
tão perto que não te vejo.
41
Quando nós, discretamente 
ficamos conosco a sós,
é que ouvimos quanta gente 
chora e ri dentro de nós.
42
Quanta palavra bonita!
Quanto perdido latim!
E quanta cera erudita
para defunto tão ruim!
43
Quem canta seu mal espanta,
diz o provérbio ilusório.
Você, rapaz, quando canta
espanta, sim… o auditório.
44
Quem só a verdade aspira
com certeza inda não viu
que a verdade é uma mentira
que inda não se desmentiu.
45
Saudade, meiga Saudade
filha do amor e da ausência,
és a nossa mocidade
durante toda a existência.
46
Saudade é um mal que consiste 
em sofrer por vontade
mas na vida o quanto é triste 
não ter de quem ter saudade!
47
Saudade, palavra doce,
que traduz tanto amargor!
Saudade é como se fosse
espinho cheirando a flor.
48
Saudade – um suspiro, uma ânsia,
uma vontade de ver 
a quem nos vê à distância 
com os olhos do bem-querer.
49
Se a mulher que está contigo 
vive do “outro” a dizer mal, 
tem cuidado, meu amigo,
ela inda ama o teu rival.
50
Se a mulher sincera fosse,
sincera como o homem quer,
era uma vez... acabou-se
todo o encanto da mulher.
51
Se estou, meu amor, contigo,
tão feliz me considero
que quero mas não consigo
dizer-te o bem que te quero.
52
Seguro porto, esperança,
dos que andam pelo alto mar!
É nas procelas – bonança, 
farol… estrela polar…
53
Se te olho de quando em quando, 
Por Deus, não é por mau fim;
é que estou verificando
se tu olhas para mim. 
54
Seu dinheiro o homem, cioso,
não confia a qualquer, 
mas a honra de esposo
deixa nas mãos da mulher.
55
Trocar ideias contigo?
É possível, mas escuta:
quero ver, primeiro, o artigo
que ofereces à permuta.
56
Tu com todo o teu ardor
não estarás enganada?
Talvez confundas amor
com o prazer de ser amada.
57
Um filósofo de peso
é desta sentença o autor:
o beijo é fósforo aceso 
na palha seca do amor.
58
Um longo olhar que se lança
numa carta ou numa flor;
Saudade – irmã da Esperança,
Saudade – filha do Amor.
59
Um sonho é ter-te ao meu lado,
a te ver, ouvir, palpar… 
Que bom sonhar acordado
sem perigo de acordar!
60
Vacinei-me contra o amor
mas não tive resultado…
Nas farmácias – é um horror!-
tudo é falsificado. 
61
Você diz que é cego o amor…
Como se engana você!
Fecha os olhos o impostor
para fingir que não vê.

Fonte:
Luiz Otávio e J. G. de Araújo Jorge (organizadores). Cem Trovas de Bastos Tigre. Coleção “Trovadores Brasileiros”- Editora Vecchi – 1959

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Brandina Rocha Lima


1
Alegria… alma embalada
de sonhos, de madrigais…
Tristeza… fim de jornada,
sem sonhos… sem nada mais…
2
Alegria… dom divino
que nasce dentro do ser,
quando um sonho pequenino
tem vontade de crescer…
3
Da Manjedoura ao Calvário,
o mundo encheu-se de luz,
no divino itinerário
percorrido por Jesus.
4
Dar um pouco de carinho
ao carente – nosso irmão –
no seu triste descaminho,
vale mais que dar um pão.
5
É penosa - e não me iludo!
- essa exaustiva jornada:
- ontem, em busca de TUDO...
- hoje, a caminho do NADA.
6
Fique alerta, coração,
não deixe o sonho passar…
pois, todo sonho é ilusão:
– jamais vem para ficar!
7
Foste aurora em minha vida,
meu sol de felicidade…
Hoje, és estrela perdida
no céu de minha saudade…
8
Fui sempre um pobre Palhaço
no Circo do meu viver,
rindo do próprio fracasso,
tentando a dor esconder…
9
Hoje, que dias tristonhos
te assaltam – triste e sozinho -
voltaste em busca dos sonhos
que deixaste no caminho…
10
Num dolente fim de tarde,
junto as mãos… e numa prece,
aconchego-me, covarde,
na saudade que me aquece…
11
Olhando o sol escaldante,
sertanejos, lá se vão...
No rosto do retirante,
há mais água que no chão!
12
O Martírio da Paixão
ao consumar-se na Cruz,
legou um Mundo Cristão
e a Terra cheia de Luz…
13
O Sonho é qual a fumaça
que se expande ao nosso olhar.
É belo, enquanto não passa,
mas, desaparece no ar…
14
Os teus penachos dourados,
Canavial… sempre ao léu…
lembram braços levantados
pedindo chuvas ao céu!
15
Quanto tempo estive… quanto!
fingindo que te esqueci…
quase que sequei meu pranto,
de tanto chorar por ti…
16
Reguei de noite e de dia,
com o orvalho do meu pranto,
a sementeira vazia
de sonho… E estéril de encanto!
17
São dois padrões de grandeza,
dois infinitos no mundo:
– O Céu: encanto e beleza…
– O Mar: mistério profundo…
18
Se a chuva desce lá fora
e corre pela calçada,
é pranto do céu… que chora
por quem não crê em mais nada…
19
Se algum dia uma saudade
maltratar teu coração,
volta! Que a felicidade
vai-te aguardar no portão…
20
Sem saber que havia escolhos
nesta vida, eu submergi
no lago azul de teus olhos
e nunca mais emergi…
21
Toda vez que você passa,
fingindo que não me vê,
meu coração descompassa
e corre atrás de você…
22
Uma cadeira vazia
fica perto da janela:
- a meu lado, todo dia,
a saudade senta nela.

Lairton Trovão de Andrade (Descontraindo em versos)

01. Destrua a melancolia, pois a vida se renova! Contra a tristeza, Maria, beba chazinho de trova! 02. O plagiário é caricato que no mundo s...