quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Milton Souza



1
A gorducha Dona Benta
quando senta esparramada
deixa a cadeira onde senta
quase um mês descadeirada.
2
Amor, barriga crescida,
passa o tempo, espera tanta...
chega o milagre da vida
que faz a mãe virar santa.
3
Ao vencedor, toda a glória!
Mas festeje com cuidados:
que a euforia da vitória
nunca humilhe os derrotados.
4
A vida é feita de escolhas:
os acertos, festejamos...
O duro é virar as folhas
nas tantas vezes que erramos...
5
Brinquedos lindos aqueles...
Mas a criança, sofrida,
trocaria qualquer deles
por um prato de comida…
6
Com flores ou cicatrizes,
horas duras e horas boas,
a infância forma as raízes
da educação das pessoas.
7
Como gato na água fria
quando vê careca perto,
porco-espinho se arrepia:
pensa no escalpo, por certo.
8
Contigo sempre reparto
este amor que não termina:
é na penumbra do quarto
que o nosso amor se ilumina!
9
Craque que chuta bastante,
seu lugar no time encontra
mas um “chute” de estudante
é, quase sempre, gol contra...
10
De tanto passar calote,
o “salafra” se deu mal:
foi com muita sede ao pote
ao lograr um policial…
11
Dizer adeus foi tolice,
mas este orgulho maldito
só deixou que eu descobrisse
depois que eu já tinha dito!...
12
Enseadas sem saída,
abismos dentro das almas:
no revolto mar da vida
não existem praias calmas.
13
Eu sou frango... e só me ralo:
se escapo de ser canjinha,
quando estou virando galo
sou morto e viro galinha.
14
Foi dura a separação...
E eu sigo nessa ressaca:
no cais do meu coração
somente a saudade atraca…
15
Gatos miam no telhado,
mas ela nunca reclama:
o som abafa o “miado”
do “gato” da sua cama…
16
Grita o galo no terreiro,
demonstrando muita zanga:
"Não sobe no meu poleiro
o frango que solta a franga."
17
Leitor viciado e indefeso:
- sempre um livro em frente a face...
eu seria um grande obeso,
caso a leitura engordasse...
18
Licor de Deus, sem mistura,
sem cores artificiais,
segue a água a brotar pura
para dar vida aos mortais.
19
Mais fortes... mais apagadas...
ora sumindo ou voltando,
as lembranças são pegadas
que o destino vai deixando.
20
Meu caminho é o teu caminho!
Se a morte nos separar,
quem chegar no céu sozinho,
chora até o outro chegar.
21
Meu sofrido coração
não guarda mágoa ou rancor:
é uma usina de perdão
que opera a todo vapor.
22
Meus sonhos não são modelos;
alguns me fazem chorar...
Mas não tenho pesadelos:
pesadelo é não sonhar!...
23
Morreu de tanto fumar,
e pra limpar seu pulmão
tiveram que colocar
três chaminés no caixão!
24
Não se queixa o pobre Zé,
ganha a vida sem mutreta:
limpador de chaminé,
só ri vendo a coisa preta.
25
No amor, deixe o leme solto:
o vento indica aonde vais...
No amor – sempre – o mar revolto
é mais seguro que o cais…
26
Num fogo constrangedor,
ele brinca com a desgraça:
“Garçom, me passa o extintor...
e empina a nova cachaça…
27
O amante, quando flagrado
pelo marido, extasia:
fica mais arrepiado
do que gato na água fria.
28
O amor que nos impulsiona
torna fácil o impossível:
nenhuma usina funciona
quando falta combustível!
29
O farol do amor é o marco
que orienta a alma perdida:
Cristo é o cais que acolhe o barco
que vaga no mar da vida.
30
O mar da vida não muda,
pouco adianta lamentar:
quando o vento não te ajuda,
usa as mãos para remar.
31
O marujo, em alto mar,
faz motim, reclama e xinga:
“Comida pode faltar,
mas não pode faltar pinga!!!”
32
O pai é sempre o primeiro
se o filho está precisando.
Quem tem um pai verdadeiro,
tem sempre exemplos sobrando.
33
Os netinhos são fregueses
de amores ilimitados:
avós são pais duas vezes,
porém, mais açucarados...
34
O velho cais destruído
pelo mar aterrador
ficou muito parecido
com nosso sonho de amor...
35
O vovô namorador
não aguenta a menininha:
- Eu tenho sede de amor,
mas a fonte está sequinha…
36
Para quem faz o que pode,
busca o rumo, insiste e tenta,
a felicidade explode
e até corrente rebenta...
37
Passa o tempo, passa a vida,
mas fica, em qualquer idade,
uma criança escondida
dentro de cada saudade...
38
Por mais que a gente se zangue,
mande embora sem escolta,
mulher chata é bumerangue:
faz a curva e sempre volta...
39
Qual licor adocicado
que embriaga devagar,
teu beijo me tem deixado
tonto e louco por te amar.
40
Quando qualquer luz se acende
faz a vida ressurgir.
A própria sombra depende
de uma luz para existir.
41
Quando a nuvem da má sorte
cobre de sombras teu mar,
a esperança é o vento forte
que faz o tempo mudar.
42
Quando no embalo do amor
almas inventam desejos,
duas taças de licor
dão novo sabor aos beijos.
43
Quando nosso amor espelha
o que o desejo revela,
a lua fica vermelha
só de espiar na janela...
44
Quando o altar vira mercado
que busca lucros ou votos,
sempre há um Deus falsificado
para enganar os devotos.
45
Quando o mar da vida, escuro,
sufoca a esperança viva,
Deus é sempre o cais seguro
para quem vive à deriva.
46
Quando qualquer luz se acende
faz a vida ressurgir.
A própria sombra depende
de uma luz para existir.
47
Quando um filho perde a trilha
perseguindo falsos brilhos,
toda a vida da família,
geralmente, sai dos trilhos.
48
Quem faz guerra soma os custos
e um dado sempre atrapalha:
quem paga o sangue dos justos
mortos em cada batalha?
49
Sempre que trepida o amor,
brotam gemidos sem fim.
Se gemido fosse flor
motel seria jardim.
50
Se não fosse a fantasia
que o sonho pinta na mente,
muita gente morreria
sem nem saber que foi gente...
51
Se nem sei se circo existe,
se chorar é o que mais faço,
por que é que o destino insiste
em me fazer de palhaço?
52
Tem tanto fogo a menina
que seu mergulho estupendo
deixa a água da piscina
completamente fervendo.
53
Todas as fontes secaram:
deserto em volta de mim...
Meus sonhos todos murcharam,
vivo na espera do fim...

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Izo Goldman



1
A casa toda quebrada,
e o casal diz numa "boa":
- Mas que furacão, que nada,
foi só uma briguinha à-toa!...
2
A grandeza imaginária
que todo vaidoso tem,
é uma estrela solitária
brilhando sobre... ninguém...
3
A Independência eu relembro,
meu Brasil, com muito orgulho:
- sonho em Sete de Setembro,
realidade em Dois de Julho!
4
Ao ser preso, o vigarista,
explica, muito matreiro:
- Sou apenas cientista,
faço "clones" de... dinheiro!
5
A queimada é um jogo insano...
A floresta pega fogo...
E, no fim, o ser humano
é o perdedor deste jogo!
6
A saudade me consome
e as angústias são pesadas,
quando eu murmuro teu nome
e o vento... dá gargalhadas...
7
A saudade não me poupa,
desenhando, fio a fio,
o perfil da tua roupa
no guarda-roupa vazio...
8
A sorte, esquiva e malvada,
não dá “chance”, só trabalho...
Eu a sigo pela estrada,
e ela foge pelo atalho!...
9
A vida pôs, por maldade,
tanta distância entre nós,
que, quando eu canto, é a saudade
que faz a segunda voz…
10
A violência eu detesto,
porque é pelo amor que eu luto,
sem amor o mundo é um “resto”
eternamente de luto!
11
Bate o sino em tom profundo,
lembrando a mulher que um dia
entregou seu Filho ao mundo,
sabendo que O perderia!
12
Cara cheia...Perna bamba,
ele mesmo se conforta,
olha a rua e diz: - "Caramba!"
Nunca vi rua mais torta!...
13
“Cara-metade”, em verdade,
é uma expressão... trapaceira...
- a gente quer a metade
mas tem que “engolir”... inteira…
14
"Casamento... - alguém já disse -
é chegar à encruzilhada
onde acaba a criancice
e começa...a criançada..."
15
Castro Alves, teu valor
está na contradição
do eterno escravo do amor
lutar contra a escravidão.
16
Coitado do Zé Maria:
- a mulher quase o esfola,
pois voltou da... pescaria...
co'um biquíni na sacola...
17
Com seu valor aumentado,
saudade é a restituição
do que já nos foi cobrado
pelos sonhos e a ilusão...
18
Contradição bem marcada,
que teima em nos separar:
- Meu amor toca a alvorada,
e o teu não quer acordar..
19
Coração não tem idade
quando vive de lembrança;
se a lembrança tem saudade,
faz, da saudade, "esperança''!
20
Depois que tu foste embora,
no meu peito, o desencanto
não desabafa nem chora,
não tem voz e não tem pranto...
21
Dois sentimentos moldados
no mesmo barro sem cor:
- é o ódio, pelos pecados,
pelas virtudes, o amor!…
22
É "Carcará" o apelido
do Zé, porque... come... e cisca...
Mas a mulher diz: - "Duvido!
Aqui em casa nem... belisca..."
23
Ele trouxe ao seu rebanho
muito amor e muita luz.
Barqueiro de um barco estranho,
talhado em forma de cruz!
24
É no rosto da criança
que o sorriso é mais bonito:
- tem a força da Esperança
e o tamanho do Infinito!
25
É nos momentos tristonhos
que eu peço à minha lembrança
que traga de volta os sonhos,
no aconchego da esperança…
26
Enquanto a guerra inundar
num dilúvio, a Terra inteira,
onde a pomba irá buscar
outro ramo de oliveira?!…
27
Enquanto eu tirava espinhos
das rosas que te ofertava,
deixavas nos meus caminhos
os espinhos que eu tirava...
28
"Esta peixada está quente!"
reclamava o Zé Maria;
e o dono do bar: - "Ó xente,
'se qué', tem pexera fria!”
29
Estás só...Mas, mesmo assim,
como se fora um castigo,
sinto um ciúme sem fim
do "ninguém" que está contigo!
30
És um arbusto florido...
Eu sou o vento que passa,
e, num delírio atrevido,
te despe e depois... te abraça..
31
Eu, na vida, sou barqueiro
dos meus sonhos sem destino:
- sonho bom é o passageiro,
sonho mau é o clandestino.
32
Eu sou príncipe tristonho
porque, na história real,
não há, na escada do sonho,
sapatinhos de cristal!...
33
Ficou rico o Zé Maria
na seca do Juazeiro,
vendendo "fotografia
de chuva"...por "dois cruzeiro"...
34
Foi no Grito do Ipiranga
que o povo outrora servil
sacudiu do jugo a canga
e fez gigante o Brasil!
35
Fui pirata, aventureiro,
no Mar da Felicidade;
hoje, a ferros, sou remeiro
na galera da saudade.
36
Jogam “xadrez” as nações,
e, no “jogo” em que se empenham,
sacrificam os “peões”,
para que os reis se mantenham.
37
Lá na casa da Maria
é muito estranha a porteira ...
Não faz barulho de dia,
bate e range a noite inteira …
38
Marcando suas fronteiras
as bandeiras eram trapos,
e, os trapos eram bandeiras,
na Querência dos Farrapos!
39
Meu conflito e meu fracasso
é que as trovas que componho
têm sempre os versos que eu faço,
e nunca os versos que eu sonho…
40
Na Barra o que mais encanta
é o contraste bem marcado: 
- o Rio, passando, canta,
e o sertão canta parado...
41
Na briga que o meu cabelo,
e a careca estão travando
lamento ter que dizê-lo,
a careca está ganhando...
42
Na cidadania existem
os deveres e os direitos,
e os "direitos" só persistem
se os "deveres" forem feitos!
43
Na imensa feira da vida,
as barracas da ironia:
- a das culpas - concorrida!...
a dos remorsos - vazia...
44
Na jangada a vela panda
parece um ouvido atento,
à espera de prece branda
que há no murmúrio do vento.
45
Na velhice, as incertezas,
para ocupar os espaços,
vão empilhando tristezas
e acumulando cansaços..
46
Nem o Sol pode entender
a estrela que ele namora:
- É “Vésper” no anoitecer,
mas é “D’Alva” à luz da aurora…
47
Nesta "corrida" da vida,
quando o Destino nos solta,
só sabemos na "saída",
que a "corrida"... não tem volta!
48
Neste sesquicentenário,
meu Brasil, sinto presente
teu passado legendário
e o teu futuro ascendente!
49
No seu biquini apertado,
Maria me deixa mudo,
pois nunca vi "tanto nada"
cobrindo, tão pouco ..."tudo"...
50
No viver o que mais cansa
são estas andanças vãs,
correndo atrás da esperança
e perseguindo amanhãs.
51
O pai da moça, que é mau,
Chega em casa e acaba o "baile"...
É que o Zé, "cara de pau",
tava namorando em..."braile"!!!
52
O teu gesto de ternura,
na minha vida sofrida,
foi um copo de água pura
matando a sede da vida! ...
53
 " O trabalho é que enobrece!"
Dizem todos ao Raul.
E ele responde: - "Acontece,
que eu detesto sangue azul!"
54
Partir é quase morrer...
É deixar na despedida
um pouco do próprio ser
e muito da própria vida…
55
Partiste, e eu fiz o que pude,
num brinde à felicidade,
mas, quando eu disse -"saúde!"
ela respondeu... "Saudade..."
56
Peixinho mais mascarado
do que aquele eu nunca vi:
- só belisca anzol marcado,
"minhoca com... pedigre"…
57
Perdoa, amor, o meu jeito
de te olhar quando te vejo,
teu olhar me diz... “Respeito!”,
meu olhar te diz... “Desejo!”...
58
Pergunta o padre ao noivinho:
- "É de espontânea vontade?"
e ele respondeu baixinho:
- "Não senhor...necessidade!...”
59
Poeta do cativeiro,
nos teus versos triunfantes,
eu vejo um "Navio Negreiro",
sobre "Espumas Flutuantes"!
60
Por artes do coração
Castro Alves foi vencido;
lutou contra a escravidão,
sendo escravo de Cupido!
61
Pulando do nono andar,
o otimista diz a alguém
que, no quarto, o vê passar:
- Até agora... tudo bem!!!
62
Quando o silêncio é uma prece,
sob a lua, em noite calma,
no meu bairro até parece
que as velhas ruas, têm alma...
63
Quando os "Dezoito do Forte"
marcharam, cabeça erguida,
não foi por desprezo à morte
e sim por respeito à vida!
64
Quando pergunta o burrinho,
diz a mula envergonhada:
- "Tu nasceste, meu filhinho,
por causa de uma...burrada!..."
65
Queimadas... Devastação...
Natureza poluída...
e os homens, por ambição,
destroem a própria vida!
66
Quem morreu naquela Cruz,
foi o Corpo e nada mais:
- ninguém apaga uma Luz
crucificando ideais!
67
Quem pela força conquista,
não conquista de verdade;
não há força que resista
à força da liberdade!!!
68
Sai do museu, braço dado
com sua sogra, o Sinfrônio:
- e o guarda grita, alarmado:
- "Tão roubando o patrimônio!"
69
Se a gente fosse dar crédito
ao que diz a maioria,
só de "autor de livro inédito"
tinha uns mil na Academia!...
70
Se a saudade embala a rede,
meu amor, de olhar frustrado,
vê, no branco da parede,
teu semblante desenhado…
71
Se a tua ausência magoa,
magoa mais a saudade...
Muitas vezes a garoa
molha mais que a tempestade…
72
Se disseres que, hoje em dia,
vivo no "mundo da lua",
depois de um beijo, eu diria:
- "Vivo sim! E a culpa é tua!...”
73
Sem esquinas ... sem saídas ...
muitas vidas são assim ...
Ruas retas e compridas,
e um grande portão no fim …
74
Se tu queres divulgar
uma notícia qualquer,
basta o fato confiar,
em segredo... a uma mulher…
75
Tem mais nobreza e valor
o triunfo conseguido,
quando, humilde, o vencedor
aperta a mão do vencido!
76
Têm uma força tamanha
as nossas trovas singelas,
que acendem, "Flor da Montanha",
mais cento e cinquenta velas!
77
Teu "Adeus" eu não censuro,
censuro é um erro fatal:
- meu amor não fez "Seguro"
que pague a "perda total"…
78
Todo "barbeiro" sustenta
que a "batida" foi assim:
- "Veio um poste a mais de oitenta,
na contra-mão, contra mim!..."
79
Uma devota a rezar
é o que a rendeira parece,
faz da almofada um altar,
de cada renda, uma prece!
80
Velho Chico, eu te saúdo,
pois vencendo o rude agreste,
fazes, acima de tudo,
a redenção do Nordeste!
81
"Vem aí um furacão!!!",
avisa a rádio, "Cuidado!!!"
e o genro por ...precaução...
põe a sogra...no telhado!!!
82
Vencendo medos e mágoas
foi que o sublime barqueiro
que andava por sobre as águas
trouxe luz ao mundo inteiro.
83
Vendo alguém varrer o chão,
ele deita de comprido,
e, dá logo a explicação:
- "Quero ser...doido varrido..."
84
Virtude é fazer o bem
pelo prazer de fazê-lo,
mesmo sendo para alguém
que não fez por merecê-lo.
85
Zé Pescador não sossega,
mente tanto que dá gosto,
só que os peixes que ele... "pega"
têm carimbo do entreposto.

domingo, 4 de dezembro de 2016

Carolina Ramos



1
Adeus, filho, segue a vida...
Volta um dia, sem promessa...
que a primeira despedida
no ventre da mãe começa!
2
A grande, a maior vitória
que até hoje consegui,
foi remover da memória
as batalhas que perdi.
3
Alforriada, ela passa
gingando frente ao feitor
e o dengo de sua raça
faz dele escravo do amor!
4
Alforria... e a voz dos bravos
se erga, potente, entre as massas,
negando criar escravos
de um ódio cruel entre raças.
5
 A liberdade germina
quando um povo pulsa e anseia,
qual semente pequenina
que rasga o solo e se alteia!
6
A lua beija a favela...
A estrela no céu reluz...
- Meu bem, apaga essa vela,
o amor não quer tanta luz!...
7
Angústia, imensa, dorida,
pior que a dor de morrer,
é não ter apego à vida
e ser forçado a viver…
8
Ante a força intransigente,
para o caos a paz resvala...
- Deus, deste alma a tanta gente
que nem sabe como usá-la!
9
Ante a lua, o mar se alteia,
tenta alcança-la na altura,
mas é nos braços da areia,
que encontra a paz que procura!...
10
Ante os dilemas da vida,
embora ilusões destrua,
à mentira bem vestida,
prefiro a verdade nua!
11
A pele negra retrata
a dor de uma triste saga,
pois o estigma da chibata
nem mesmo a alforria apaga!
12
A penumbra da saudade
torna os meus dias tristonhos
e eu bendigo a claridade
das estrelas dos meus sonhos!
13
As bandeiras desfraldadas..,
O povo em vai-vem nas ruas...
e as esperanças sonhadas
são minhas... e também tuas!
14
A sós, na penumbra doce...
Neste agora sem depois,
é como se o mundo fosse
um mundo só de nós dois!...
15
A verdadeira alforria
é aquela que estende as mãos,
unindo em plena harmonia
branco e negro, como irmãos.
16
Bendigo o dom da poesia:
- num mundo de tais perigos,
deu-me a serena alegria
de achar um mundo de amigos!
17
Bichinho cheio de manha,
terno e manso quando quer;
mas, zangado, morde e arranha:
- É gato? - Não... é mulher!
18
Boneca sem cor, partida...
uma bola abandonada...
- Saudade mostrando à vida
quanto vale um quase nada!
19
Buscá-la cansa, é verdade...
mas a vida nos ensina:
- Se queres felicidade,
olha a seta...só lá em cima!
20
Como pode haver poesia
nos rumos da humanidade,
se tarda tanto esse dia
da paz ser PAZ de verdade?
21
Das cores, qual a mais bela?
- "A negra" - diz o ceguinho...
"pois, dentre todas, é aquela
que eu vejo no meu caminho."
22
Dessa cruel liberdade
de ofender, há quem abuse
a esquecer de que a verdade
um dia talvez o acuse!
23
Deu a tantos seu carinho
que no enlace, em confusão,
deu o sim para o padrinho
e o beijo no sacristão!
24
Ele chega de mansinho,
velho cão ressabiado...
mas, se conquista um carinho,
nos dá carinho dobrado!
25
Ele mente e se arrebata
com tal veemência e desplante,
que, se um besouro ele mata,
vira o besouro elefante!
26
Embora sozinha eu siga
e sigas também a sós,
dentro do amor que nos liga
não há distância entre nós!
27
Enquanto a vida nos cansa,
o poeta, fugindo ao chão,
vai procurar a esperança
entre as nuvens de algodão!
28
É possível que aconteça:
Seja folclore ou novela,
tanta gente sem cabeça...
por que não mula... sem ela?
29
Esse que vive algemado
às paixões, odiando a esmo,
mesmo sendo alforriado,
segue escravo de si mesmo!
30
Esta penumbra... Este frio,
este agora sem porquê...
Este silêncio vazio
é o meu mundo sem você!
31
Filho, a montanha da vida,
escala devagarinho,
que há muita flor escondida
entre as pedras do caminho!
32
Guarda sempre esta mensagem
da própria vida que diz:
- è feliz, quem tem coragem
de acreditar que é feliz!
33
Há contraste em nossas vidas
mas, perfeito é o desempenho:
luz e sombra, quando unidas,
dão força e vida ao desenho…
34
Há vidas que se parecem
com as roseiras viçosas:
quando podadas, mais crescem
e mais se cobrem de rosas!
35
Já velhinho, sonha ainda,
mantendo o brilho no olhar,
que a juventude só finda,
quando é impossível sonhar!
36
Lembrando a ternura antiga,
minha saudade se exalta...
- Bendigo a penumbra amiga
que me esconde a tua falta!
37
Liberdade de calar
todos têm, mas, cuida, pois,
ser livre é poder falar
e seguir livre depois!
38
Liberdade, em termos sãos,
vale mais se, humildemente,
podendo retê-la em mãos,
nós a damos de presente!
39
Liberdade é o grande anelo!
Na mansão, casebre ou ninho,
é o cobiçado castelo
quer do rico ou pobrezinho!
40
Mente com tal propriedade,
que ao mentir jamais hesita
e quando diz a verdade,
nem ele mesmo acredita.
41
Mesmo descendo a montanha,
não temo abismos do mundo;
- quando a Fé nos acompanha,
pode haver flores no fundo!
42
Não prolongues a partida...
Vai... não olhes para atrás,
dói bem mais a despedida,
quão mais longa ela se faz!
43
Não temas portas fechadas,
nem mesmo fracassos temas,
há sempre forças guardadas
para as conquistas supremas.
44
Na penumbra, o berço é um templo,
ajoelho e em ternura enorme,
entre rendas eu contemplo
meu pequeno deus que dorme!
45
Não se queixa de ser pobre,
quem, no seu modesto lar,
trabalha e feliz descobre
que é livre para sonhar!
46
Na vida, a luta não cessa
em prol do sonho e do pão
e a liberdade começa
onde acaba a servidão!
47
Na vida, quanta maldade
não punida, se repete!
E, em nome da liberdade,
quantos crimes se comete!
48
No amor o tempo se gasta
com medidas desiguais:
se estás longe, ele se arrasta;
se perto, corre demais!
49
No claro-escuro da vida,
fusão de alegria e dor,
a penumbra é colorida
se for penumbra de amor!
50
No Livro da Eternidade,
o herói a expirar, exangue,
a História da Liberdade
escreve com o próprio sangue!
51
Nosso amor, quadras desfeitas,
de um poema sem achados...
Rimas tristes, imperfeitas,
fechando versos quebrados!...
52
Nós somos duas tipóias,
somando forças escassas:
- quando eu fracasso, me apóias,
te apoio, quando fracassas!...
53
O mar da vida parece
que, às vezes, quer me afogar,
mas, Deus, que nunca me esquece,
atira a boia no mar!...
54
O mar, raivoso, se alteia,
como todos, quer a altura,
mas, é nos braços da areia
que encontra a paz que procura.
55
O mundo é paisagem triste,
chora o rico e o pobre chora...
- Meu Deus, se a ventura existe,
onde será que ela mora?!
56
Os ponteiros marcham lento,
mais um ano que se acaba
- pede PAZ meu pensamento,
para um mundo que desaba!
57
Ouço teus passos serenos
e o meu abraço se expande,
mas sinto os braços pequenos,
para ternura tão grande!
58
Para os que entregam ao nada
os sonhos que ontem sonharam,
o orgulho é terra pisada
moldando os pés que a pisaram…
59
Passa o tempo... bem depressa...
a roubar o que nos deu,
e, uma dúvida se expressa:
- passa o tempo... ou passo eu?!
60
Pequenino grão latente,
que brota e aos poucos se expande,
criança é humana semente,
na conquista de ser grande.
61
Pobre pássaro!... é de crer
que a prisão não mais suporta
- e vale a pena viver
se a liberdade está morta?!
62
Por te amar, tenho sofrido,
mas não me arrependo: Vem!
- Quem ama as rosas, querido,
ama os espinhos também!
63
Preso ao tronco, em ais tristonhos,
geme o negro, sem alarde...
- para quem não tem mais sonhos,
a alforria chegou tarde...
64
Quando a penumbra descia,
a nossa emoção vibrava,
sonhando o que não dizia,
dizendo o que nem sonhava!...
65
Quem se agarra a uma quimera,
quem persegue uma utopia,
age como se soubera
que sem sonhos... morreria!
66
Quem não sabe, quem não sente
que às vezes nos custa caro
essa audácia de ser gente,
quando ser gente é tão raro?
67
Que o presente se reparta
com o passado, sem queixa...
- A memória não descarta
o que a saudade não deixa!
68
Queres vencer? - Pensa bem
e não dês passos a esmo,
ninguém pode ser alguém
sem conquistar a si mesmo.
69
Se amigo é o que escuta a queixa,
seca o pranto e ajuda a rir,
mais amigo é o que não deixa
sequer o pranto cair!
70
Se a ternura nos aquece
e um grande amor nos ampara,
é quando a penumbra desce
que a vida fica mais clara!
71
Se eu sinto fugir a calma
e até viver me angustia,
eu abro as janelas da alma
e deixo entrar a Poesia!
72
Sempre acolho de mãos postas
e, humilde, tento aceitar
o silêncio das respostas
que a vida não sabe dar!
73
 Ser livre é também saber
que a liberdade alcançada
faz parte do próprio ser
e não se troca por nada!
74
Ser mau é fácil...insiste
em ser bom, sempre a lembrar:
- bondade, às vezes, consiste
em ver, ouvir... e calar!...
75
Sofre e perdoa sem grito,
o mal que de alguém se emana,
que há outro Alguém no Infinito,
maior que a maldade humana!
76
Sussurrando com ternura,
prova a fonte, sem revolta,
como é possível ser pura,
mesmo tendo lama em volta.
77
Teu amor... tal força tinha,
que a saudade me conduz
e esta penumbra só minha
ainda é cheia de luz!
78
Vai-se um dia... Vai-se um mês...
E eu te imploro, sem revolta,
se não regressas de vez,
esta noite, ao menos, volta!

Lairton Trovão de Andrade (Descontraindo em versos)

01. Destrua a melancolia, pois a vida se renova! Contra a tristeza, Maria, beba chazinho de trova! 02. O plagiário é caricato que no mundo s...