sexta-feira, 7 de abril de 2017

Maria Nascimento Santos Carvalho


1
“A bruxa anda solta” aqui…
disse o meu genro e correu
quando entendeu que entendi
que a tal da bruxa era eu…
2
Acusando a carestia,
sai quase nua , a vizinha,
e diz que é uma fantasia
boa, barata e fresquinha…
3
A distância achando meios
para unir nossas metades,
somou nossos devaneios
e dividiu as saudades!...
4
Agora o que me conforta,
ao ver meu mundo ruir,
é saber que uma outra porta
noutro mundo há de se abrir!...
5
Aguiar num caminhão,
“barbeiro “como ninguém,
entrou mal na contramão,
mas veio o Guarda, e entrou bem!
6
A jura que eu fiz, um dia,
quando antevia a saudade,
não passou de fantasia
com roupagem de verdade...
7
Ao caíres em fracassos
em meio à falta de luz,
carregarei nos meus braços
os braços da tua cruz.
8
As mães são divinas plantas
que deram flores, sementes.
Para Deus são todas santas
com milagres diferentes.
9
A saudade é um bem guardado
que nos volta, de repente,
num presente do passado,
quando o passado é presente.
10
A ser feliz não me furto,
mas tentando te esquecer,
meu tempo ficou tão curto
que me esqueci de viver...
11
As razões dos teus deslizes
tantas mágoas me causaram
que as marcas das cicatrizes
nunca mais cicatrizaram...
12
Às vezes, na despedida,
num simples modo de olhar
se diz o que em toda a vida
ninguém ousa revelar.
13
Às vezes, somos felizes,
mas um erro pequenino
que se esconde entre os deslizes
trabalha contra o destino...
14
A vida é estranha aquarela
que, conforme a sorte pinta,
dá luz e beleza à tela
ou somente espalha a tinta...
15
A vida me faz cobrança
pelas chances que me deu...
Mas meus mitos de criança,
Roubou-me, e não devolveu...
16
Buscando, em vão, tua volta,
o torpor de quem delira,
minha saudade te escolta
numa volta de mentira!...
17
Carrego triste os escombros
da vida alegre que eu tinha,
e deixou sobre os meus ombros
uma cruz que não é minha...
18
Comeu goiaba exultando,
mas quase esvaiu-se em baba,
quando viu se estrebuchando
meio bicho na goiaba…
19
Dei asas à fantasia...
e pequei por não saber
que o meu direito valia
muito menos que o dever...
20
Deixaste de me escrever,
e agora, sem lenitivo,
nem sei como vou viver,
se deste amor é que eu vivo.
21
Ele ronca e não desperta
e a mulher por previdência,
deixa a porta sempre aberta,
para “casos” de emergência…
22
É mais triste a hipocrisia,
mais profunda a cicatriz
de quem demonstra alegria
para fingir que é feliz!
23
Em face da discrepância
existente entre os conceitos,
procuro sempre distância
dos que julgam perfeitos.
24
Em teus momentos de fúria,
não dou resposta ao que dizes,
pois não vai ser outra injúria
que vai curar cicatrizes...
25
Ensina com tolerância
à criança pequenina
a ver o que é bom na infância,
que o restante a vida ensina...
26
Entregue à volúpia cega
que anula a voz da razão,
meu coração não se entrega,
mas eu me entrego à paixão…
27
Escrava do teu fascínio,
penso, às vezes ter direito
de me caber o domínio
das batidas do teu peito.
28
Eu não te culpo, querido,
se entre nós deu tudo errado,
que, em amor mal resolvido,
não há somente um culpado.
29
Foste embora... e a vida segue,
malgrado o sonho desfeito,
fazendo com que eu carregue
um mito morto no peito.
30
Fungava a sogra com asma
e o genro dela já farto,
gritou: – socorro! Um fantasma
está rondando o meu quarto…
31
Incurso em poligamia,
depois que foi condenado,
disse : – Credo! eu nem sabia
que já tinham me casado !
32
Meia-luz não me tortura
nem faz pesar minha cruz,
porque a penumbra é a mistura
que Deus faz de treva e luz!
33
Me lembro que certa feita
pertinho de uma fogueira,
desejei uma caneta
só para escrever besteira…
34
Mesmo vivendo em conflito,
vencendo mágoas e intrigas,
o nosso amor infinito
suporta o peso das brigas.
35
Meu mundo era um mundo puro,
mas o destino vilão
trocou meu mundo seguro
pelo caos de um mundo cão...
36
Meu remorso se restringe
à minha mudança brusca
cada vez que você finge
que me ilumina... e me ofusca.
37
Meu vizinho briga à-toa,
porque é um sujeito estourado,
mas, vendo a mãe da patroa,
perde logo o rebolado.
38
Minha jangada se lança
num mar revolto e jamais
deixa no cais a esperança
ou volta, sem ela, ao cais...
39
Minha sogra, honrando bem
seu conhecido conceito,
diz que genro sempre tem
abundância… de defeito.
40
Misterioso e impreciso,
teu amor, foi, na verdade,
inferno, céu, paraíso,
solidão, mágoa... e saudade…
41
Na cama é amante perfeito,
já fora de garantia,
porque apresenta um defeito
só dorme, ronca e assobia…
42
Nada prometas, nem peças
que eu siga a tua jornada,
que é inútil fazer promessas
a quem não crê mais em nada...
43
Não deixe as cartas que eu mando
sem respostas, por favor,
porque é bom de vez em quando
reler mentiras de amor.
44
Não me orgulho em fracassar
quando as derrotas assumo...
é que eu não posso mudar
um rumo que não tem rumo!
45
Não sabia onde nem quando
perdi meu sonho, querido,
mas, de novo te encontrando,
achei meu sonho perdido.
46
Na presença de um Juiz
murmurei sim: que tolice...
- Foi o " sim" mais infeliz
que um ser humano já disse! ...
47
Nestas horas de abandono,
não ligo a insônias, porque
eu nem preciso de sono
para sonhar com você...
48
No documento é solteira,
mas vendo a idade da dona,
diz a patroa encrenqueira:
solteira, não, solteirona…
49
No momento em que partiste
pranteei minha viuvez...
Foi o trajeto mais triste
que uma lágrima já fez...
50
O amigo que estende a mão
nos momentos de perigo,
é mais irmão que um irmão
que não sabe ser amigo...
51
O chofer ficou “por conta”
ao ser fechado na rua
por uma perua tonta
que guiava outra perua…
52
O circo fechou... e agora
que o fracasso veio à tona
o palhaço, triste, chora
escondido atrás da lona...
53
O Destino com seu laço
bendito e, às vezes, ferino,
me relegando ao fracasso
deu um nó no meu destino.
54
O Lalau tinha a mania
de assaltar Padre gordão,
porque sonhava algum dia
ser “Operário Padrão”…
55
O mar, com véus de cambraia,
que tece fio por fio,
cobre as areias da praia,
quando a praia sente frio...
56
O ninho de amor que outrora
guardava o nosso carinho,
vazio de amor, agora
nem parece o mesmo ninho...
57
O teu ciúme doentio
que, em vez de unir nos afasta,
é igual à pedra de rio
que nem o limo desgasta!
58
O teu desprezo me agride,
mas o teu olhar aceso
sugerindo que eu revide
agride mais que o desprezo!
59
O vazio me incomoda,
pois, com seu relho ferrenho,
chicoteia, aturde e poda
todos os sonhos que eu tenho!
60
O vizinho tem mania
de não pegar no pesado,
pois, quando chegar seu dia,
quer morrer bem descansado
61
Pão-duro, morto-de-fome,
o meu vizinho Gastão
diz a todos que não come
com medo de indigestão …
62
Para sofrer por amor
Não há limite de idade,
Pois seja em que tempo for,
Saudade é sempre saudade...
63
Partiste... e na despedida
no teu "ar" de quem conspira,
vi quando perdi de vida
com um sonho de mentira...
64
Partiste... e não me lamento
nem em prantos me consumo,
que eu já sei que és como o vento,
que muda sempre de rumo...
65
Perdoa aquele que nega
o teu mérito evidente,
que o despeito às vezes, cega
os olhos de muita gente!
66
Por ciúmes vejo, agora,
já bem perto da partida
que acabei jogando fora
metade da minha vida .
67
Porque a sorte deu-me as costas,
na luta inglória e sofrida,
eu não encontro respostas
para as perguntas da vida.
68
Porque a vida é a maior graça,
a minha alma se angustia
por ver que um dia que passa
é sempre menos um dia...
69
Por saber que não te alcanço
nem me abres jamais as portas,
vou de remanso em remanso,
como um rio de águas mortas.
70
Por teu amor me perverto
e aceito qualquer proposta,
mas não pode haver acerto
para apelos sem resposta...
71
Protegendo os inocentes
é que Deus, sábio demais,
põe cenários diferentes
nas impressões digitais!...
72
Quando a Sara viu o custo
do tratamento que fez,
foi tão violento o susto
que adoeceu outra vez !
73
Quando o peão, no chiqueiro,
tirou a bota do pé,
sentiu no cheiro outro cheiro
misturado ao do chulé !
74
Quando você me critica
e aos amigos faz venenos,
o seu próprio gesto indica
qual de nós dois vale menos.
75
Que eu creia em tuas saudades
é debalde que sugiras,
pois, no amor, grandes verdades
escondem grandes mentiras!
76
Quem me chama de palhaço
com ironia na voz.
Nem sente que há sempre um traço
de palhaço em todos nós...
77
Quem quer fugir de um suplício
e no abismo não se joga,
diz Não! à droga do vício
que torna a vida uma droga !
78
Sentindo que o tempo corre,
eu tenho medo do fim:
cada minuto que morre
mata um pouquinho de mim...
79
Seu “hobby” era trabalhar,
mas tinha tanta preguiça
que, até pra se espreguiçar
ficava “enchendo linguiça”…
80
Se voltas arrependido.
dói tanto a tua amargura
que eu posso ouvir o gemido
da chave, na fechadura.
81
Sinto que o amor se desgasta
em tuas cartas que leio,
porque ternura não basta
apenas pelo correio.
82
Só é feliz quem supera
o conflito da esperança
entre o muito que se espera
e o pouco que a gente alcança.
83
Sou demais agradecida
por tudo quanto alcancei
porque recebo da vida
muito mais do que sonhei!...
84
Tantas injúrias trocamos,
que, mutuamente ofendidos
agora nos encontramos
como dois desconhecidos.
85
Tanto a coroa se pinta,
para fingir que é mocinha,
que afoga as rugas na tinta
e engrossa os pés de galinha.
86
Um gaiato de mau gosto,
vendo um gordo esbaforido,
disse: é suor no teu rosto
ou toicinho derretido! ?
87
Vai devagar, coração,
controla a tua ansiedade,
porque, às vezes, solidão
dói menos do que saudade...
88
Velava o esposo ainda quente
mas sendo boa, a viuvinha,
convocou seu pretendente
para não chorar sozinha!…

quinta-feira, 6 de abril de 2017

Milton Nunes Loureiro (1923 - 2011)


1
A bebida que me invade,
parecendo não ter fim,
é a tristeza de uma grade
que se fecha dentro em mim...
2
A ciência me conduz
a pensar desta maneira:
do excesso, às vezes, de luz,
pode nascer a cegueira...
3
Amanhã... Depois... Depois...
Foi assim a vida inteira...
E entre os sonhos de nós dois,
a intransponível fronteira...
4
A penumbra que me invade
e que nunca chega ao fim,
é a janela da saudade
fechada dentro de mim...
5
Apesar dos solavancos
em minha vida sem cor,
adornei, com lírios brancos,
nossos segundos de amor...
6
A tristeza que me invade
e que nunca chega ao fim,
é a esquina de uma saudade
que eu dobro dentro de mim...
7
A tristeza que me invade
e que nunca chega ao fim,
é uma história de saudade
que existe dentro de mim...
8
A tristeza que me invade,
parecendo não ter fim,
é o cantar de uma saudade
que eu ouço dentro de mim...
9
A tristeza que me invade,
parecendo não ter fim,
é um passado de saudade,
que chora dentro de mim...
10
A vida às vezes revela
certos contrastes assim:
eu – enredado por ela;
e ela – a tramar contra mim!
11
Chegaste, os braços abertos
após as tuas andanças
E trouxeste aos meus desertos
mil motivos de esperanças...
12
Chegaste, os braços abertos,
tranquila... em tuas andanças,
e plantaste em meus desertos
mil sementes de esperanças...
13
De tanto sofrer na vida,
eu peço a Deus, sem revolta:
- Abra as porteiras da ida,
feche as porteiras da volta!...
14
Do poder tens o infinito,
à fortuna tens direito,
mas não sufoques o grito
do amor que vive em teu peito...
15
Embora colhendo espinhos
em meu viver malogrado,
semeio pelos caminhos
bem-me-quer por todo lado...
16
Embora sempre tristonhos,
são os teus olhos, querida,
dois candelabros de sonhos
pondo luz em minha vida.
17
Encerrando a caminhada
que anuncia o fim da vida,
corajoso na escalada,
tenho medo da descida...
18
Enquanto a noite vagueia
pela minha solidão,
a distância mais ateia
o fogo desta paixão...
19
Entardece e a caminhada
leva ao outono da vida…
Se a subida é quase nada,
é dolorosa a descida!…
20
Entre caminhos, frementes,
os meus lábios, em volteios,
dançam valsas diferentes
na vereda dos teus seios...
21
Esperança, não me peças
que acredite em tuas juras...
Já me cansei de promessas
e me perdi nas procuras...
22
Essa angústia que me invade,
parecendo não ter fim,
é a triste rua-saudade,
que chora dentro de mim...
23
Esta carta que ora mando
a você, com muita ânsia.
é a saudade soluçando
sobre os trilhos da distância.
24
Esta cautela, querida,
que persiste entre nós dois,
dá mais vida à nossa vida
e mais crença no “depois” ...
25
Esta pergunta te faço,
meu coração sonhador:
- se possuis tão pouco espaço,
como guardas tanto amor?...
26
Eu não entendo, Senhor,
a diferença das ruas:
- Umas, repletas de amor,..
outras, de amor, sempre nuas.
27
Eu não sei, meu Deus, por que,
tendo a vida em desalinho,
encontro sempre você
ao longo do meu caminho.
28
Fronteira é a mais desumana
das humanas criações:
desiguala e desirmana
homens de iguais corações!
29
Imagens difusas... Sonho
irrealizado, sofrido,
que eu componho e recomponho
na dor de te haver perdido...
30
Liberta este amor profundo
dos grilhões dos teus desertos,
que o maior Homem do mundo
morreu de braços abertos.
31
Não quero o poder que esmaga
o sonho com seu furor..
Eu quero o poder que afaga
nossos momentos de amor ...
32
Neste mundo passageiro,
a vida, que vai fluindo,
é um intervalo ligeiro,
dois silêncios dividindo...
33
No amor é bom ter cuidados
para evitar dissabor...
Nem sempre em beijos trocados
trocam-se beijos de amor.
34
O amanhã, que importa agora?
Que nos importa o depois?...
Vamos viver, vida afora,
o imenso amor de nós dois!...
35
O poeta em sua lida,
ainda que o mundo o afronte,
nos devaneios da vida
vai muito além do horizonte...
36
O poeta em sua lida,
ainda que o mundo o afronte,
tem sempre o aceno da vida,
que o leva além do horizonte...
37
O poeta em sua lida,
ainda que o mundo o afronte,
tem sempre um sopro de vida
que o leva além do horizonte...
38
O poeta em sua lida,
ainda que o mundo o afronte,
vence as distâncias da vida
e vai além... do horizonte...
39
O tormento que me invade,
parecendo não ter fim,
é o sininho da saudade,
que plange dentro de mim!
40
Primaveris e frementes
os meus lábios, em volteios,
trocam passos diferentes
sob o manto dos teus seios...
41
Profano, sem horizonte,
caminho, sedento e triste,
à procura de uma fonte
que eu nem mesmo sei se existe...
42
Sem direito de sonhar,
vagando no mundo, a esmo,
nem sequer pude marcar
encontro comigo mesmo!
43
Sem jamais fazer menção
ao destino que a conduz,
a raiz, na escuridão,
mantém os ramos na luz!...
44
Senhor, escuta os cicios
dos excluídos, sem teto...
Troca seus ninhos vazios
por ninhos cheios de afeto!
45
Se o meu tempo está marcado
e da saudade eu disponho,
invento alguém ao meu lado,
cerro meus olhos e sonho...
46
Somente tristes lembranças
vão comigo pela estrada...
Eu, que plantei esperanças,
colho derrotas... mais nada...
47
Talvez exista, suponho,
no pensar que em mim se espalma,
razões para achar que o sonho
é sempre o cinema da alma.
48
Tanta ternura mostrando,
teus olhos – juro por Deus –
são mil promessas bailando
na valsa do nosso adeus...
49
Tarde demais...e as lembranças
vão comigo pela estrada...
eu que plantei esperanças
vivo de sonhos... mais nada...
50
Teu poder de sedução
e a magia dos teus braços,
levam minha solidão
a percorrer os teus passos ...
51
Todas as pedras, querida,
que a vida atira em nós dois,
dão mais vida à nossa vida
e mais crença no "depois"...
52
Uma verdade patente,
que não tem contestação:
abrir ESCOLA é semente
que fecha muita prisão.

quarta-feira, 5 de abril de 2017

Oswaldo Soares da Cunha (1921 - 2013)


1
Abraços, beijos de fogo,
em vez de aplacar o amor
que anseia por desafogo,
mais aumentam seu furor.
2
Abro os meus olhos e vejo
que a manhã radiosa avança,
borrifando a natureza
com o orvalho da esperança!
3
A esperança é uma criança
que ninguém pode com ela:
nem bem saiu pela porta,
torna entrar pela janela.
4
A flor que eu contemplo agora,
em meu ser quer pendurar,
insiste em ficar no foco
do meu deslumbrado olhar.
5
A gente em geral tropeça
naquilo que há de través:
Mas aquele que tem pressa,
tropeça em seus próprios pés.
6
Amigos, são todos eles
como aves de arribação:
- Se faz bom tempo, eles vêm...
- Se faz mau tempo, eles vão...
7
A mulher e sua saia
não conseguem combinar:
A mulher vai se assentando,
a saia quer levantar…
8
Ao homem sempre se fala
que escute a voz da razão;
mas é que a razão se cala,
quando fala o coração.
9
Aquele olhar suplicante
penetra em nossos refolhos:
Sem dar sequer um latido,
o cão implora com os olhos!
10
A raiva maior que tive,
 eu tive porque sonhei
que estava quase a beijar-te
      e de repente acordei!
11
Às vezes, durante a missa,
voando vinha de fora
uma veloz andorinha
visitar Nossa Senhora.
12
Coração não tem memória,     
é um ditado verdadeiro: 
o amor que temos por último,   
parece ser o primeiro.
13
Cresceu demais minha aldeia,
Meu Deus, que desilusão:
Hoje, tão grande e tão cheia,
não cabe em meu coração.
14
Das dores todas da vida,  
não pode haver maior dor
que passar a vida inteira
sem dor nenhuma de amor.
15
De querer-te como quero,
que culpa é que posso ter?     
Bem sabes que sou sincero,
se te quero é sem querer.
16
Ele recusa comida,
ainda que seja pouca,
para não ter o trabalho
de ter que levá-la à boca …
17
Em qualquer lugar que estejas,
entre flores ou abrolhos,
a mesma distância, ó vate,
separa do céu teus olhos!
18
Em travesseiro de nuvens
repouso a minha cabeça:
Na companhia dos anjos,
queira Deus que eu adormeça.
19
Eu amava uma palmeira,
lá longe, no entardecer…
Veio a noite traiçoeira,
não vi mais meu bem-querer!
20
É uma troca de carinho
a amizade: basta ver
um burro coçando o outro,
como tremem de prazer.
21
Eu nunca pedi um beijo,
não gosto de beijo dado:
Pra matar o meu desejo
tem que ser beijo roubado.
22
"Felicidade é quimera!"         
Costuma a gente exclamar.
Porém, lá dentro, baixinho,      
nunca a deixa de esperar.
23
Juntos, ficamos calados.
    Também, para que falar?
Entre dois enamorados,
basta a linguagem do olhar.
24
Na clara manhã de Minas,
a andorinha de asas pretas
é uma criança traquinas
dando no céu piruetas!
25
Não gosto de fazer contas,
a conta sai sempre errada.
Por isto virei poeta,
não faço conta de nada …
26
Não tem idade alguma,
quem tem apenas metade:  
a liberdade, ou é inteira,
ou não é liberdade.
27
Não ter amor e fingir
é difícil a valer;
mas acho que é mais difícil
ter um amor e esconder.
28
Nem mesmo a joia mais cara
prova toda a gratidão:
Tem algo que só se paga
dando o próprio coração.
29
Nenhum valor ia ter,
para nós, a gratidão,
se não se pudesse ser
ingrato sem punição.
30
Nesta casa com janelas
a minh’alma fez morada:
Mas a casa não é dela,
é só uma casa alugada.
31
Ó canarinho de outrora,
meu canarinho querido,
parece que eu te ouço agora
cantando no meu ouvido!
32
O cão, teu fiel amigo,
mostra mais satisfação
ao ver que trazes contigo
um bom pedaço de pão.
33
Ó chá de malva cheirosa,
- folha com nome de flor -
cujo perfume de rosa
se transfigura em sabor.
34
O lampião, noite escura,
lá no fundo do sertão,
filtra uma luz doce e pura
que enternece o coração.
35
Olho o céu, olho as montanhas,
olho uma nuvem passar…
e acabo me convencendo
que a alma é função do olhar.
36
O nosso amor à justiça
vem do medo que se sente
de que algum dia a injustiça
possa sobrar para a gente.
37
O poeta é uma pessoa
que vive sempre ocupada:
Faz versos andando à toa,
mas julgam que não faz nada.
38
Ó sino de alma de bronze,
indiferente da sorte,
tanto celebras a vida
como celebras a morte.
39
Os profetas, com ameaças,
ganham fama onde aparecem,
já que não faltam desgraças,
que todo dia acontecem.
40
Os quadros que foi juntando
ao pintor devem pesar
talvez mais que as obras primas
que ele deixou de pintar …
41
Para os outros, sou feliz.
Deixa que pensem assim:
Seja eu feliz para os outros,
já que o não sou para mim.
42
Pecados de amor, só são
pecados de dar horror,
se forem, na ocasião,
praticados sem amor.
43
Pode fazer-se um favor,
fazer dois e mesmo três,
que apenas será lembrado
aquele que não se fez.
44
Por mais alto que cheguemos,   
sempre a ambição é mais alta:
nunca vemos o que temos,
só vemos o que nos falta.
45
Por que a esperança é verde?
– É verde porque a ventura  
que ela promete na vida  
jamais se encontra madura.
46
Provérbios temos aos centos,
este é dos mais verdadeiros:
– Deus criou os alimentos
e o Diabo, os cozinheiros …
47
Quem perdeu a namorada,
não se queixe nem reclame:
Se não tem mais a que amava,
procure outra a quem ame.
48
Quero dizer-te um segredo
em uma linguagem louca:
não dê boca para ouvido,  
mas de boca para boca....
49
Que teu amigo não entre
do teu lar na intimidade:   
onde começa a mulher,
aí termina a amizade.   
50
Quisera, sem ter morrido,
no éter viver disperso,
Eeser simplesmente o ouvido
que escuta a voz do Universo
51
Saudade, vaga presença,
coisa que bem não se explica:
algo de nós, que alguém leva...
algo de alguém, que nos fica.
52
Se quer cativar alguém,
use palavras de mel.
Que nem as moscas, ninguém
costuma gostar de fel…
53
Se solto alguma tolice,
eu mesmo, depois de tudo,
me envergonho do que disse,
melhor ter nascido mudo.
54
Tão doce é a prisão do amor
que, em vez de sentir saudade,
eu hoje lamento os dias
que passei em liberdade.
55
Tenho um punhado de netos
que acho o maior dos baratos:
São lindos quando estão quietos
e sorrindo nos retratos …
56
Toda a água que existia
sumiu dos sertões distantes,
para brotar, em seguida,
dos olhos dos retirantes!
57
Todo mundo quer ser nobre,
ter parentesco com os ricos.
Só um era irmão dos pobres:
chamava-se São Francisco.
58
Tu, ó Maria da Glória,
que tanta graça irradias,
mais que Maria da Glória,
és a glória das Marias!
59
Uma árvore longa e seca,
perdida no chapadão,  
foi a  imagem mais perfeita
que já vi da solidão.
60
Vieste, Felicidade;   
mas, ai de mim, só agora
fiquei sabendo quem eras,
depois que te foste embora.
61
Vive o homem mergulhado
no trabalho, em louco afã ,
do céu deixando o cuidado
para o dia de amanhã.

Lairton Trovão de Andrade (Descontraindo em versos)

01. Destrua a melancolia, pois a vida se renova! Contra a tristeza, Maria, beba chazinho de trova! 02. O plagiário é caricato que no mundo s...