segunda-feira, 24 de abril de 2017

Humberto Del Maestro (Vitória/ES)

1
A chuva cessou há pouco, 
mas o frio continua... 
Grita o vento como um louco 
por entre os becos da rua. 
2
Acordo, olho o céu e vejo 
que a manhã imaculada 
traz os perfumes de um beijo 
que roubou da madrugada. 
3
A minha casa é pequena, 
e embora tal restrição, 
nela reside serena 
minha doce inspiração. 
4
Amo a minha biblioteca, 
doce nave da ilusão, 
pois nela sigo até Meca 
ou molho os pés no Jordão. 
5
Ando em busca da centelha 
do teu beijo de esplendor 
e da papoula vermelha 
que escondes com teu pudor. 
6
Ao longe, de madrugada, 
por sobre o mar terno e lindo, 
a pequenina jangada 
parece a lua dormindo. 
7
As nossas línguas macias, 
em carícias muito loucas, 
parecem duas enguias 
disputando em nossas bocas. 
8
A tarde se abrasa em cores 
e lentamente desmaia. 
O céu, pintado de flores, 
lembra uma enorme lacraia. 
9
A tarde triste adormece. 
Estrelas piscam em cruz... 
Ao longe, a lua parece 
delgada foice de luz. 
10
A trova é um poema grácil, 
que surge de um mundo etéreo: 
- Para quem sabe é bem fácil. 
- Pra quem não sabe é um mistério. 
11
Brilha o céu como turquesa 
e o nascente é de romã… 
Nunca vi tanta beleza 
surgindo assim, na manhã. 
12
Chego a pensar que sou forte, 
vendo a velhice chegar, 
pois mesmo perto da morte 
consigo ainda sonhar. 
13
Cresci buscando esperança, 
nada achei e foi fatal. 
E quantas deixei, criança, 
brincando no meu quintal. 
14
De noite durmo e desperto... 
E, nesse doce vaivém, 
a infância chega tão perto 
que escuto apitos do trem. 
15
De tudo quanto me assiste, 
neste mundo miserando, 
nada me fala mais triste 
do que a velhice chegando. 
16
É frio, a noite descansa; 
o espaço é vasto e medonho. 
De repente, a lua mansa 
surge nos braços de um sonho. 
17
É noite calma de lua. 
Os ventos, em rodopios, 
são violinos na rua 
tocando valsas nos fios. 
18
Escondes mito e bonança 
na aparente timidez. 
Tens a graça e a temperança 
de um gatinho siamês. 
19
Essa mancha exígua e preta, 
no seu colo alvo e desnudo, 
lembra frágil borboleta 
toda feita de veludo. 
20
Fico olhando o teu aprumo. 
És linda e jovem demais... 
E eu sou um barco sem rumo, 
sem mais direito ao teu cais. 
21
Inefável labareda, 
a borboleta a voar 
parece um lenço de seda 
que um anjo esqueceu no ar. 
22
Meditando em meu cansaço 
não me entristeço nem rio... 
os troféus do meu fracasso 
valorizam meu vazio. 
23
Menino ainda acredito, 
olhando o céu com minúcia, 
que as estrelas do infinito 
sejam mimos de pelúcia. 
24
Meus versos feitos de sedas, 
do mais puro tom lilás, 
lembram calmas alamedas 
em tardes cheias de paz. 
25
Minha porta, que era arguta, 
de repente ensandeceu. 
Qualquer toque que ela escuta, 
julga logo ser o seu. 
26
Na doce tarde de outono, 
ruflam brisas em farol. 
As nuvens louras, sem dono, 
lembram novelos de sol. 
27
Na estrada que compartilho, 
meu coração, aos pedaços, 
lembra a mãe que já sem filho 
nina a solidão nos braços. 
28
Nasci na vida tristonho 
e vou por ela tão sério, 
que é por isso que o meu sonho 
tem as marcas de um cautério. 
29
Noite linda. O céu aberto 
faz-se de suave emoção. 
A lua chegou tão perto 
que eu quase a peguei na mão. 
30
Numa batalha renhida, 
vou lutar até o fim, 
pois quero sair da vida 
muito melhor do que vim. 
31
O arquiteto faz o traço, 
seu trabalho é no nanquim. 
Eu vivo as trovas que faço, 
que elas são partes de mim. 
32
O dia já nasce lindo. 
Passam ventos frios, nus. 
A manhã acorda rindo 
num escândalo de luz. 
33
Olhos brandos, mãos que espargem 
sorrisos como troféu... 
Pelo que os filhos lhe fazem 
as mães merecem o céu. 
34
O menino que era sonho 
de alma da cor do marfim, 
não sei mais onde é que o ponho, 
depois que cresceu em mim. 
35
O tempo amassou meu rosto. 
Não doeu, foi devagar... 
Mas as mágoas e o desgosto 
como é que custam passar. 
36
Pai querido, não morreste, 
que a morte nos lembra um fim 
e tudo aquilo em que creste 
anda a viver dentro em mim. 
37
Passa o vento num arrulho. 
A noite é fria lá fora. 
Como é gostoso o barulho 
da chuva caindo agora. 
38
Pelas manhãs de bonança, 
junto à brisa que flutua, 
borboletas são crianças, 
brincando alegres na rua. 
39
Penso ainda ser menino, 
correndo à toa na rua, 
empinando, sem destino, 
a branca raia da lua. 
40
Pressinto estar de partida 
e o mistério me seduz. 
Se fecho os olhos na vida 
acordo em mimos de luz. 
41
Que bom ficarmos juntinhos, 
distantes de um novo adeus, 
pois vejo nos seus olhinhos 
todo o carinho de Deus. 
42
Quero as minhas tardes feitas 
de luzes em algazarras; 
cheias de cores perfeitas, 
com festivais de cigarras. 
43
Saudade é dor muito estranha, 
toca no peito tão fundo 
que sinto que a minha entranha 
abriga as dores do mundo. 
44
Saudoso comprei passagem 
de retorno à minha infância. 
Mas como seguir viagem 
se eu nem sei mais a distância? 
45
Tem encanto, tem magia 
minha pequena janela, 
que ao abri-la a cada dia 
eu vejo a vida mais bela. 
46
Trabalho, sofro, padeço 
carregando a minha cruz, 
para ver se pago o preço 
desta roupagem de luz. 
47
Tudo se foi da lembrança... 
E do nosso antigo enredo 
nem mais a marca da aliança 
se acha gravada em meu dedo. 
48
Um doce aroma flutua 
nesta noite de ateneu 
e há tanta paz pela rua 
que eu penso que o céu desceu. 
49
Um gesto só, um arranjo, 
um traço apenas de acuro 
e acabarás sendo o anjo 
que em minhas preces procuro. 
50
Um remorso me espezinha 
se ponho, com aflição, 
no seu corpo de andorinha 
meus olhos de gavião. 
51
Veio Deus. Do caos agreste, 
ergueu o espaço sem fim. 
Porém tu bem mais fizeste 
do nada que havia em mim. 
52
Vitória: – um colar de ilhas! 
Cantar-te, com que talento?! 
Já bastam as maravilhas 
que escuto na voz do vento.

domingo, 23 de abril de 2017

Giselda de Medeiros Albuquerque (Fortaleza/CE)

1
Aprendi, na tua ausência,
uma lição ponderada:
– que a espera, com paciência,
torna mais breve a chegada.
2
As trovas são diamantes
que certo ourives, um dia,
com suas mãos operantes,
cravou no anel da poesia.
3
Cem anos da abolição
e o negro sofre a desgraça
de acorrentar-se à prisão
do preconceito da raça!
4
Chove a cântaros... e o frio
cai sobre tudo, por fim...
E, enchendo este meu vazio,
chovem saudades em mim...
5
É carnaval… e em meu peito
qual um sagaz folião,
brinca o meu sonho desfeito
nas alas da solidão…
6
É o mais belo panorama
e de Deus o melhor verso
o sol ressurgindo em chama,
banhando de ouro o universo.
7
Essas rugas que há no rosto,
mostrando a idade inclemente,
são rumos onde o desgosto
caminha, pisando a gente.
8
Esse gemido tristonho
das ondas, sempre a chorar,
é a voz queixosa de um sonho
preso nas conchas do mar!
9
Felicidade... momentos
de emoções transcendentais,
que se vão na asa dos ventos
e não voltam nunca mais!
10
Lançada a sorte! Em verdade,
eu parti... Mares medonhos!...
E, no Porto da Saudade,
fui ancorar com meus sonhos…
11
Leu tanto amor… e, no entanto,
sozinha, a cigana, à morte,
convive com o desencanto
de não ler a própria sorte!…
12
Não deixes preto o teu céu...
Vê que as grandes tempestades
espalham sombras ao léu,
mas vêm, depois, claridades.
13
Nesta existência sofrida, 
triste certeza me invade: 
– o sonho ardendo na vida, 
e a vida a arder na saudade.
14
O teu adeus, mesmo em sonho,
me aniquila de tal sorte
que, estando viva, suponho
estar nos braços da morte!
15
Por te amar tão loucamente,
fui-me tornando um palhaço,
fazendo rir tanta gente
às custas do meu fracasso.
16
Por um momento de sonho,
que dure uma eternidade,
darei tudo e não me oponho
a viver só da saudade.
17
Ri, palhaço, que o teu riso
vai à dor dar acolhida,
transformando em paraíso
teu picadeiro da vida.
18
Se a noite vem, com azedume,
vestindo de preto o céu,
que sejas tu, vagalume,
e espalhes luz a granel.
19
Sê como o mar, grandioso,
cujo esplendor estonteia,
mas, humilde e generoso,
vem bordar rendas na areia!
20
Se vires um tom de escuro
na trilha dos rumos teus,
não temas, e vai seguro,
que é a sombra da mão de Deus.
21
Sublime, aquele momento
em que o poeta, risonho,
põe asas no pensamento
e voa, buscando o sonho.
22
Tenta esconder o teu pranto,
às frustrações, ao desgosto,
pois não há maior encanto
que mostrar a paz no rosto.
23
Teu olhar, por sorte, às águas,
sombra nenhuma deixou,
no entanto deixou-me mágoas
nesta sombra que hoje eu sou!
24
Teus olhos, ardentes círios,
meus dias tornam risonhos,
e tuas mãos, brancos lírios,
vão modelando meus sonhos.
25
Vasculhando meu passado,
encontrei nele, tristonho,
teu retrato empoeirado
na gaveta do meu sonho.
26
Vencendo todo o cansaço,
decerto gargalharei,
pois hoje sou um palhaço
dos sonhos que não sonhei.

sábado, 22 de abril de 2017

Eduardo Toledo


1
Acalme a ira em seu sangue 
e as injustiças suporte, 
pois a ofensa é um bumerangue 
que sempre volta mais forte! 
2
A fé, de crenças tamanhas, 
é um rio largo e bendito 
que vai transpondo montanhas 
e deságua no infinito! 
3
Ainda vejo da varanda, 
em frente à Igreja Matriz, 
o meu pai regendo a banda 
e a praça inteira feliz! 
4
A mentira mais fingida 
que aprendi, quando criança, 
foi ouvir que pela vida 
quem espera sempre alcança. 
5
Ao devolver minhas cartas, 
o carteiro nem sabia 
que, além de saudades fartas, 
os meus sonhos devolvia! 
6
A saudade se embaraça 
e a paixão se intensifica... 
- Não pelo instante que passa, 
mas pelo instante que fica! 
7
A vingança não me agride, 
pois tenho de prontidão 
as armas para o revide: 
- o entendimento e o perdão! 
8
Bate a neblina... Em meu quarto, 
na solidão que me invade, 
a saudade inventa um parto... 
e nasce uma outra saudade! 
9
Corroendo o coração 
e a cabeça endoidecendo, 
o ciúme é a sensação 
do que se vê... não se vendo! 
10
Durmo tranquila e feliz 
na madrugada sem lei, 
quando meu filho entra e diz: 
- A bênção, mãe, eu cheguei!!! 
11
Em minha filosofia 
o amor é um barco ao relento: 
- soberbo na calmaria... 
- e incauto à fúria do vento!!! 
12
Em pouco mais que um segundo, 
e sem quaisquer cantilenas, 
a trova canta este mundo 
em quatro versos apenas! 
13
Meu pai, que venero tanto, 
e não sai dos sonhos meus, 
foi muito mais do que um santo, 
foi cá na Terra o meu Deus! 
14
Minha assanhada vizinha, 
enrugada e sem calor, 
parece um velho "fusquinha" 
já "rateando" o motor. 
15
Minhas saudades, no estágio 
de tantos sonhos em vão, 
até hoje pagam ágio 
no guichê da solidão! 
16
Não te rendas nunca à dor, 
se o teu bem tem rumo incerto, 
pois, muitas vezes, no amor, 
esse longe é muito perto! 
17
Na viagem da ilusão, 
pela tarde azul e morna, 
vivo a esperar na estação 
um trem que nunca retorna! 
18
Neném... Zé Gordo... Tuinha... 
Zeca saci... (Que distância!) 
- Cadê a turma que eu tinha 
na rua da minha infância"? 
19
No engenho do desencanto 
vou moendo a soledade 
e destilando o meu pranto 
no alambique da saudade! 
20
No leilão do teu amor, 
se a prenda for um romance, 
eu pago qualquer penhor 
e cubro o último lance! 
21
No trem da vida prossigo 
e, à luz da terceira idade, 
eu vou levando comigo 
um vagão só de saudade! 
22
No verão, alguns maridos 
caem nos blocos da cidade... 
Pintam lábios, põem vestidos 
e assumem a outra metade! 
23
O homem conquista e arrebanha 
mais altura e põe-se em pé, 
quando desce da "montanha" 
e professa a sua fé!!! 
24
O inverno fecunda o chão 
com sêmens de orvalho e espera 
as flores que brotarão 
do ventre da primavera! 
25
O medo que me intimida, 
ante o terror e o poder, 
é o medo da própria vida 
que não se pode viver. 
26
O meu sonho misantropo, 
deslizando na subida, 
até hoje busca o topo 
do pau-de-sebo da vida! 
27
O nosso amor, cuja essência 
é uma volúpia banal, 
parece até reticência 
com ar de ponto final! 
28
"O que é o amor?" me perguntas, 
e, em coro, os anjos entoam: 
"são duas pessoas juntas 
que se amam e se perdoam!” 
29
Os meus sonhos vão ao léu, 
pelas asas da ilusão... 
- Plantando flores no céu... 
- Colhendo estrelas no chão! 
30
O sonho que me incendeia 
à luz da terceira idade 
parece uma lua cheia 
no infinito da saudade! 
31
Por mais que eu galgue as montanhas 
dos sonhos, dos ideais, 
vem uma voz das entranhas 
e me ordena: "SUBA MAIS"!!! 
32
Por ser caboclo do mato, 
de capina a vida inteira, 
meu mundo tem o formato 
de uma roça sem fronteira! 
33
Recordações na parede, 
cacos de sonhos no chão 
e o passado, numa rede, 
embalando a solidão! 
34
Sua história... seus desterros... 
Minas, de formas Gerais, 
apesar de muitos erros 
nos deu acertos demais! 
35
Tendo a paixão como escolta 
e o coração em sentido, 
saudade é um sonho que volta, 
sem que nunca tenha ido! 
36
Um aroma diferente 
envolve a terceira idade: 
– é quando o olfato da gente 
sente o cheiro da saudade! 
37
Vaga o meu sonho ao luar 
num dilema permanente: 
- se pesca a estrela-do-mar... 
- se colhe a estrela cadente!!!

quinta-feira, 20 de abril de 2017

Campos Sales


1
A chama aos poucos se apaga
velando este amor desfeito,
enquanto a saudade afaga
o sonho morto em meu peito!
2
Ah! se Deus juntasse um dia,
as águas dos desenganos,
só de lágrimas, teria
outros tantos oceanos…
3
A lama seca rachada
lembra as malhas de uma rede,
na paisagem desolada
de um rio morto de sede!
4
A minha lembrança insiste,
de uma maneira indiscreta,
em ser uma rima triste.
nos versos deste poeta!
5
Ao cantinho que era nosso,
que, em nosso adeus se desfez,
eu volto sempre que posso,
e choro tudo outra vez…
6
Ao luar de tantas luas,
minha São Paulo querida,
fiz, somando as suas ruas,
a estrada da minha vida!
7
Ao menor abandonado,
que ávido um prato consome
a gula não é pecado,
o pecado é passar fome!
8
Ao poeta, não quiseste,
e, acredite, vida minha,
que o mundo que tu lhe deste
era o tudo que ele tinha…
9
A receita é de colírio
mas, o bebum se apavora
e diz, cheio de delírio:
“pinga, só uma vez por hora?!”
10
A mágoa que a um pai consome,
e do olhar rouba-lhe o brilho,
é ver a cara da fome
na cara do próprio filho!
11
Angústia que a um pai consome,
e do olhar rouba-lhe o brilho,
é ver a cara da fome
na cara do próprio filho!
12
Boteco é a maior desgraça,
grita o padre em tom agudo;
acabem com a cachaça,
grita o bebum - eu ajudo!
13
Chego de cabeça erguida,
à vida, devo o que sou,
tudo o que aprendi na vida,
foi a vida que ensinou…
14
Cobra a vida o preço justo,
por nossos erros fatais,
ser feliz a qualquer custo,
é sempre caro demais !
15
- Custa essa grana o motel?
– É cinco estrelas, meu bem.
- Então vamos pro “moitel”,
lá estrela é o que mais tem.
16
Detalhe triste e sombrio
é o rastro que alguém deixou
na lama seca do rio
que a seca também matou!
17
Distante de quem adoro
minha alma triste se queixa,
tento fingir que não choro,
mas meu semblante não deixa!
18
Fantasmas de dois defuntos,
namorando à luz da lua:
– Meu bem, vamos dormir juntos?
– Na minha tumba, ou na tua?!
19
Foi juntando os pedacinhos
de um velho sonho desfeito
que as mágoas fizeram ninhos
na varanda do meu peito...
20
Lágrimas dos sonhos vãos,
já não guardam meus segredos,
se escondo o rosto nas mãos,
elas vertem entre os dedos!
21
Lembro o sertão, seu encanto,
a lua cheia, tão minha,
sem nada eu ter, tinha tanto,
naquele nada que eu tinha…
22
Meu mundo foi devastado,
não por um vento qualquer; 
foi passagem de um tornado,
que tem nome de mulher.
23
Meu mundo se foi com ela
e, no vazio que resta,
a saudade abre a cancela
e a solidão faz a festa…
24
Meu sonho se foi com ela,
e no vazio que resta,
a saudade abre a cancela
e a solidão faz a festa!
25
Mulher por Deus concebida
é o fruto que ao mundo veio,
trazendo a fonte da vida
na vida do próprio seio.
26
Não passei por faculdades,
curso algum eu concluí
passei, sim, dificuldades,
mas, enfim, cheguei aqui…
27
Na solidão da moldura,
ainda vejo em teu olhar,
o momento em que a ternura
se deixou fotografar…
28
Nem a esperança conforta
o pai que vê, com tristeza,
a fome rondando a porta,
querendo sentar-se à mesa!
29
No beco, os dois às escuras,
depois da orgia tão louca,
notaram que as dentaduras,
tinham trocado de boca!
30
No leito frio da cova,
Luiz Otávio, afinal,
se fez semente de trova,
e a trova o fez imortal!
31
Nos campos que a relva cobre
minério em profusão,
fui só um menino pobre
sem escola, pés no chão…
32
No silêncio da moldura,
ainda vejo em seu olhar,
o momento em que a ternura
se deixou fotografar.
33
Nossas culpas divididas,
por castigo ou por maldade,
dividiram nossas vidas,
sem dividir a saudade!
34
Nos telhados da cidade
a garoa não cai mais,
somente a minha saudade
ainda escorre dos beirais!
35
O adeus foi breve, no entanto,
naqueles olhos morenos,
uma gotinha de pranto
falou bem mais que os acenos.
36
O pranto do amor desfeito,
motivo do meu desgosto,
rompe a barragem do peito
e se esparrama em meu rosto.
37
Pelos caminhos do bem,
quem faz o bem nem percebe
quão nobre é o vício que tem
quem dá mais do que recebe…
38
Pode parecer bravata,
mas, no fundo, não é não
eu sou, sim, autodidata,
quer na escrita, ou na canção…
39
Por mais que uma frase doa,
sangrando fundo no peito,
a saudade até perdoa,
é a mágoa que não tem jeito!
40
Quando os olhos rasos d'água
fazem do rosto a vertente,
parece que toda a mágoa
busca refúgio na gente.
41
Quando o tempo bate à porta
e a saudade invade o peito,
cansaço a gente suporta,
mas, solidão não tem jeito! 
42
Quando o vento em tarde calma,
teu rosto toca mansinho,
saiba, meu bem, que é minha alma
que vem fazer-te um carinho.
43
Queixando-se do calor,
no consultório, a gatinha:
– Ponho onde a roupa, doutor?
– Deixa ali, perto da minha…
44
Saudade, aço que corta,
fazendo estragos no peito:
A mágoa, a gente suporta,
mas, solidão, não tem jeito…
45
Sei que esquecê-la é preciso,
mas a esperança perdida
vai apagando o sorriso
no rosto de minha vida!
46
Sem precisar das imagens
ou linguagens que os ensinem,
os olhos trocam mensagens
que as palavras não definem.
47
Se queixando do calor,
no consultório a gatinha,
- Ponho onde a roupa doutor?
- Deixa ali perto da minha...
48
Silente, o mendigo reza,
e a indiferença que o espia,
não sabe o quanto lhe pesa
a mão que estende, vazia…
49
Só Deus conhece a tristeza,
de um pai que lutando em vão,
vê a fome rondando a mesa,
e a mesa faltando o pão!
50
Terra selvagem, seu moço,
bem diferente daqui,
nos confins do Mato Grosso,
às margens do Taquari…
51
Teu retrato desbotado
que há tanto tempo perdura,
é um perfil do meu passado
na solidão da moldura!
52
Viu revoltada, a baranga,
seu marido, “moralista”,
quase nu, soltando a franga,
no desfile na Paulista…

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Alfredo Aranha


1
Ah!... Se você não adere,
à nossa boa amizade,
eu sinto o espinho que fere
meu coração de saudade.
2
A minha casa contém
muito amor, paz e carinho
para os amigos que vêm
ocupar meu feliz ninho.
3
A minha colega Flora
dos meus tempos de criança,
ao ver passar nossa aurora,
a retenho na lembrança.
4
As minhas melhores trovas
eu guardo no coração
onde todas dão as provas
da minha grata emoção.
5
De quando eu era criança
relembro o sítio, o pombal:
– Aquela terna lembrança
do fundo do meu quintal.
6
Do meu Pai muito adorado
recordo com alegria,
seu exemplo justo e honrado
na minha infância sadia.
7
Eu não sinto diferença
dos três sobrinhos que tenho,
porque nesta minha crença
pra eles, a Deus me empenho.
8
Eu sou como o beija-flor
que tenta alegrar a vida
com ternura multicor
ao beijar a Margarida.
9
Há dias que me lamento.
Em outros, mantenho a calma.
Se controlo o pensamento,
há tempestade em minha alma.
10
Minha mãe, muito querida
é uma santa aqui na terra.
Toda alegria da vida
que o meu coração encerra.
11
Minha vida foi feliz
nas asas de uma ilusão.
Hoje a saudade me diz
que só resta a solidão.
12
Não tenho filho nem filha
que me afague o coração,
pois eu vivi tal qual ilha
perdida na solidão.
13
O meu sangue e o dele é um elo
de ternura e de afeição
que agradeço a Deus. Marcello
é o meu estimado irmão.
14
Ó minha musa querida!
Deste meu querer imenso!
És o amor da minha vida;
é por ti que vivo e penso!...
15
Poetas e Trovadores
encantam de amor o mundo,
onde mostram seus valores
com seu verso mais profundo.
16
Quando Deus levou meu pai,
eu agoniado e aflito
senti na vida que sai,
soar no mundo o meu grito.
17
Quando um dia a conheci,
meu coração disparou.
Foi tão perdido por ti,
que ainda não se encontrou.
18
Saudade vive comigo...
e não deixo de sonhar.
Se um amor eu não consigo
na minha vida encontrar!
19
Se a vida agora o castiga
provocando cicatriz,
deixe que o sonho prossiga
e procure ser feliz.
20
Se moço ou velho, o Poeta
na tristeza ou na alegria
faz da vida linda meta,
com as flores da harmonia!
21
Sou da terra do esplendor,
Sergipe do meu Brasil,
templo de cultura e amor
e conceito varonil.
22
Toda beleza e ternura
tão natural em você,
explica a grande loucura
que eu sinto e não sei porquê.
23
Um beija-flor me contou
que viu você namorando.
Em outro galho pousou
e ficou me consolando...
24
Você só chegou agora
no outono da minha vida
para encontrar nova aurora
na mocidade perdida.

Lairton Trovão de Andrade (Descontraindo em versos)

01. Destrua a melancolia, pois a vida se renova! Contra a tristeza, Maria, beba chazinho de trova! 02. O plagiário é caricato que no mundo s...