sexta-feira, 30 de abril de 2021

Conselhos para Fazer a Boa Trova


1 – Estude português.

Conheça ou procure conhecer bem a língua, o vocabulário e seu funcionamento (ou seja, a gramática). O poema é feito de palavras em ação, transmitindo pensamentos e sons. Como o pintor precisa conhecer as tintas e suas maneiras de se ligarem, como o músico necessita saber tudo sobre as notas musicais e os instrumentos que utiliza, o poeta precisa conhecer bem sua matéria prima, ou seja, os vocábulos da língua, como eles interagem uns com os outros. Portanto, se você não sabe português, procure saber.

2 – Leia os bons autores.
Estude a maneira como trabalharam a palavra, a frase, o verso. Procure descobrir como é que eles chegaram a certas soluções, a certos efeitos de que você gostou.

3 – Aprenda bem a metrificação.
Procure inteirar-se dos segredos da contagem silábica. O ideal é você procurar quem conheça a técnica e estudar com ele.
     
4 – Faça exercícios poéticos de metrificação.
Não tenha preguiça de fazer, mesmo sozinho, exercícios poéticos de metrificação. Nestes exercícios, procure imitar as trovas ou os trechos dos quais você gosta, variando ou modificando os temas originais. Lembre-se: qualidade e não quantidade é o que se quer da obra de arte.

5 – Valorize-se.  
Não publique qualquer besteira. Só se permita publicar aquilo de que realmente goste. Exerça rigorosa autocensura de qualidade. Lembre-se que seu nome está em julgamento cada vez que alguém lê algo assinado por você.

6 – Não tenha medo de emendar obras já terminadas ou até publicadas.
A comunicação é difícil e há sempre uma melhor maneira de dizer alguma coisa. Vale a pena modificar trechos para alcançar ou aproximar-se, pelo menos, da perfeição.

7 – Por outro lado, há um momento em que se deve parar.
Muitas vezes – e isto se dá frequentemente com a trova, que é composição quase que instantânea – o melhor a fazer é abandonar aquele caminho, jogar tudo fora e começar tudo de novo.

8 –  Exercitando sua criatividade.
Uma boa maneira de exercitar sua criatividade é, mesmo tendo alcançado a comunicação, e feito uma trova que considera boa, recomeçar e tentar comunicar a mesma coisa com outra trova de maneira diferente. Às vezes o resultado disto é tão bom que as duas trovas resultantes podem ser aproveitadas.

9 – A trova exige ser pensada antes de ser escrita.
É importante que ela diga alguma coisa, tenha um achado, algo que lhe dê um quê especial, que a torne única entre as outras trovas, ou seja, personalidade. Aproveite bem aquele exíguo espaço de 28 sílabas poéticas. Todas as palavras devem ter função, e não deve faltar nenhuma palavra. Este é um dos grandes segredos da boa trova.

10 – O trabalho final deve estar limpo e completo.
Os versos devem ser fáceis de ser lidos e entendidos, as palavras em sua ordem certa, sem mutilações ou inversões. As dificuldades de composição não devem transparecer no resultado final. Tire os andaimes do edifício antes de apresenta-lo ao público.

11 - Melhore a qualidade de suas trovas antes de se aventurar em livros medíocres.
Um conselho importante para os novos trovadores ávidos de publicar livros de trovas, antes de ter seus livros jogados no fundo de um sebo criando teias de aranha com trovas sem atrativos, procure melhorar a qualidade de suas trovas estudando mais elas. Leia as trovas dos mestres trovadores, mas não fique só na leitura, perceba como foram estruturadas, as rimas utilizadas, o conjunto de palavras, sinta a emoção que elas passam. Não se deixe levar pela ânsia de publicar livros indiscriminadamente, o trovador de quilate não é avaliado pelos livros que publica ou concursos que participa, mas pela qualidade de suas trovas. Existem grandes mestres trovadores reconhecidos no mundo das trovas que nunca publicaram livros e/ou nunca participaram de concursos. Repito, melhore a qualidade de suas trovas... A TROVA AGRADECE. 

12 –  Cuidados com a sonoridade e distribuição das vogais.

Na composição do verso da trova, você deve tomar cuidado com a sonoridade, particularmente com a distribuição das vogais pelas sete sílabas, especialmente as tônicas. Será interessante, para evitar a monotonia e aumentar o efeito estético, que as vogais de apoio das tônicas das palavras do verso sejam todas diferentes no mesmo verso.

Esclareço com exemplo: 
“Amada e adorada fada” é um verso onde todas as sílabas tônicas (a 2ª, a 5ª e a 7ª) possuem a vogal de apoio “a”. 
 
Resultado: monotonia. No verso “Passarinho, tuas penas”, já as sílabas fortes são todas diferentes: a terceira sílaba tem vogal de apoio “i”, a quinta “u” e a sétima “e”. Note-se que o colorido já é outra coisa!

13 – Uso inteligente das vogais e transmissão de sentimentos

Você deve aprender o uso inteligente das vogais, especialmente na transmissão de sentimentos, tanto nas rimas como nas vogais de apoio das sílabas tônicas do verso. 
 
Não chego ao exagero de dizer (como diziam os parnasianos) que a cada vogal corresponde uma cor – mas, indubitavelmente, as cores claras, a alegria, a leveza, estão nas vogais mais abertas – a – é e ó. 
 
A tristeza, a gravidade, o luto, a morte, o pesadume são domínio das vogais ê, ô e u. O “i” tem algo tem algo de elétrico, subitâneo, cortante, gritante, frio... O ê, êm, on (ou õ) e o na (ou ã) transmitem volúpia, langor, preguiça, paragem...

14 – Não complete frases com recursos sem necessidade.
Não use clavilhas, ou palavras colocadas ali sem necessidade, apenas para completar as sete sílabas do verso. Procure utilizar todas as sílabas para reforçar a mensagem.

15 – Por outro lado, não use palavras mutiladas pelo apóstrofo.
A língua portuguesa é riquíssima de sinônimos e de recursos, e as chamadas “licenças poéticas” não cabem mais na trova moderna. Não se escreve mais “minh’alma” e copo d’água”; a elisão se dá na pronúncia, normalmente.

16 – Não inverta a ordem natural das palavras.
A não ser quando permissível na linguagem comum. Tais inversões, muito usadas na poesia do passado, perturbam a fluência natural do entendimento do verso.

17 – Não utilize frases vazias, apenas para “encher linguiça”.
Trovas a gente às vezes vê onde a mensagem está concentrada em apenas um ou dois versos – sendo os outros constituídos de umas bobagenzinhas com rima, só para completar a trova. Não faça isso. Deve usar os quatro versos para dizer algo em todos eles – e com todos eles.

18 – Tome cuidado com os cacófatos.
Leia sua trova em voz alta para ver se não entrou nela alguma “palavra pirata”, roubando o sentido da frase e destruindo qualquer efeito poético que você quis dar, formada, por exemplo, com sílabas de palavras contíguas: 
“o álbum da moça”, 
“pouca galinha”, 
“não há sapatos” (que pode ser entendido por “não assa patos”), 
“que belos versos compus” (versos doentes, pois estão com pus...).

19 – Não use palavras dissonantes, malsoantes, com “encontros” ou “esbarrões” de sílabas tônicas.

Ex: “nesta data tão querida”. 
 
Evite coisas como a preposição “como”, que pode transformar-se em tempo verbal de “comer”: “como a poeira dos anos”, ou “desabrocha” – que pode significar “diz a brocha”...

20 – Não use expressões batidas, lugares comuns.
Procure sempre ser original, combinar as palavras de maneira nova. Afinal a arte poética é isso: a procura incessante de novas maneiras de expressão.

21 – Os adjetivos devem ser usados com parcimônia.
Os substantivos e os verbos são a essência da comunicação verbal. Os adjetivos devem aparecer pouco, apenas para colorir, perfumar, temperar.

22 – E a rima?

Importantíssimo elemento da trova, que só possui no máximo duas, ou seja, dois pares de versos com rimas iguais. E essas duas rimas devem ser escolhidas com cuidado e critério. As rimas devem parecer surpresas de se encontrar, mas ao mesmo tempo contentes com o encontro.

23 – Evitar que os dois pares de rimas fiquem parecidos entre si.
Ou seja, tenham sons idênticos. Para isso, não devem ter as vogais de apoio iguais: para isso, não devem ter as vogais de apoio iguais: 
óde/ófa; une/ula; ado/ave – 
ou serem homófonos: ente/ezes; uva/lua; ora/oda.

24 – Não rimar timbres diferentes de “e” e de “o”.
Chapéus não rima com Deus, nem festa com cesta, nem foi com herói, etc.

25 – Evitar rimas muito fáceis.

Mesmos tempos de verbo: amaram/voltaram; serão/amarão.

Ou diminutivos: amorzinho/cachorrinho.

Ou advérbios em mente: somente/constantemente.

Quando aparecer uma rima em diminutivo, rimar com outra palavra de mesma terminação: cachorrinho com vinho, vizinho, ninho... Constantemente com gente, ausente, etc.

26 – Evitar rimas evidentes, já muito batidas.

noivo/goivo; 
noite/açoite; 
olhos/abrolhos; 
água/mágoa; 
Brasil/gentil/varonil.

27 – Evitar as cavilhas de rima.
Por exemplo: inventar nomes próprios, às vezes pouco usuais ou inexistentes, e introduzi-los na trova só para resolver um problema de rima. Tal recurso é muito usado em concursos de trovas humorísticas, mas não convence.

28 – Rime categorias gramaticais diferentes.

Recurso antigo, mas eficaz, é procurar rimar categorias gramaticais diferentes. Substantivos com verbos, adjetivos com pronomes, etc.
Exemplos: verdes/terdes; foi/boi; assim/vim; nada/adorada...

29 – Importante auxiliar da composição é o dicionário de rimas.
Um livro onde aparecem, listadas de acordo com as suas rimas, as palavras da língua. Existem diversos no mercado.

30 – Também o dicionário da língua é importante auxiliar de composição.
Você deve conhecer o significado profundo e inequívoco de cada palavra que emprega.

31 – Para escrever uma trova não há fórmula ou receita de bolo.
Começa-se escrevendo um dos quatro versos da trova. Este será o núcleo inicial, do qual nascerão os outros, já determinando um dos dois pares de rima, e não é, necessariamente, o que ficará no início da trova. O verso seguinte complementará o pensamento ou rimará com ele. Será interessante ir numerando de 1 a 4, a provável posição final dos versos que vão nascendo. A necessidade da rima ou da fluência verbal podem, depois, modificar tal posição.

Prossegue-se a composição, tentando, mudando a disposição das palavras, brincando com elas, descobrindo sua música e seus significados, tendo em vista, naturalmente, a ideia, a mensagem a transmitir, o sentimento a comunicar – e um efeito final especial, o “achado” que, para ser achado, precisa ser procurado...

Na dúvida de qual verso ou maneira de expressão adotar, vá escrevendo as diversas soluções (com sinônimos, palavras de mesma rima, etc), na folha em branco, embaixo da outra. Assim você não esquecerá delas e as terá à disposição para o caso, por exemplo, de ter de interromper o trabalho ali para fazer outra coisa. Tal listagem de alternativas do mesmo verso facilitará a escolha final – que, por sua vez, pode ser até uma solução híbrida entre duas alternativas da lista.

Você só será um bom trovador se dedicar tempo para estudar as trovas, veja os mestres, repasse as suas trovas se poderia melhorar, compare-as, Nunca esqueça, existem trovadores que são premiados uma vez ou outra em concursos, cujas trovas em seu geral são medíocres. Como mencionei no conselho 11, melhore a qualidade de suas trovas, faça-as se possível, todos os dias, veja os temas dos concursos anteriores e faça trovas sobre eles. Compare com as premiadas. E acima de tudo, não leia com os olhos, leia em voz alta, deixe as palavras fluírem dentro de você para poder sentir a emoção que elas lhe passam. 
  
Fonte:
José Antônio Soares (org.). Antologia de trovas, volume 1. Editora Caravela, 1988.

sábado, 13 de março de 2021

Alvitres do Professor Renato Alves - 6 -


25.

Na mesma linha camoniana do “fogo que arde e não se vê  /  ferida que dói e não se sente”, eis,  na trova ao lado,  uma bela aplicação da  “antítese”,  figura de linguagem tão adequada para definir a natureza contraditória do amor.
 
O amor é sorriso... ou pranto.
O amor é nuvem... ou sol.
O amor é lágrima... ou canto.
O amor é treva... ou farol.
Maria Thereza Cavalheiro

 
26.

Além do escorreito português dos verbos em 2ª pessoa do plural (rireis, saberdes, pousais), esta trova apresenta um interessante emprego da palavra “verde” com carga semântica dupla: verde = cor e verde = jovem, em oposição aos maduros olhos do poeta.
    
Rireis talvez ao saberdes
como eu me sinto em apuros
se pousais os olhos verdes
nos meus olhos já maduros!
José Fabiano

 
27.
Na literatura, o efêmero, o passageiro, o transitório sempre esteve representado pela metáfora do “nome escrito na areia” que o mar vem e logo apaga. Veja que belo aproveitamento desta imagem na trova ao lado.
    
Malgrado a graça suprema
que o nosso olhar incendeia,
a juventude é poema
que a vida escreve na areia.
Élen de Novaes Félix
 
28.

Está no jogo de palavras, na inteligente manipulação das variantes semânticas do vocábulo “pena”, a beleza do achado desta primorosa trova do mestre  Izo Goldman.
 
Que pena que as minhas penas
não te causem pena alguma,
e, sem pena, eu seja apenas,
entre as penas... só mais uma!
Izo Goldman

29.

A maioria dos concursos exige a menção da palavra-tema na trova. Muito já se discutiu sobre tal obrigatoriedade e as opiniões são bem divergentes. Mas veja  aqui uma bela trova, premiada em Nova Friburgo em que  a ausência da palavra não prejudicou em nada a ideia de “Presença”, o tema proposto
    
O livro, o cigarro ao lado,
o rádio, o abajur antigo...
Eu deixo tudo arrumado
fingindo que estás comigo...
Maria Tereza Noronha

quinta-feira, 11 de março de 2021

Izo Goldman (O Uso do Computador)


Creio que, talvez por uma secreta aversão, o uso do computador está criando problemas. Não se “escreve” mais o que se deseja publicar, basta sentar, digitar e mandar; talvez esteja faltando um pouco de tempo para “pensar” ou para “conferir”; talvez ninguém mais “escreva”, “ponha na gaveta”, “leia”, “confira”, “reescreva” e, só então, divulgue. Alguns fatos, lamentavelmente, confirmam meu ponto de vista, vejamos:

- Quando o Informativo da Seção São Paulo publicou a notícia sobre a Comissão de Fiscalização, rapidamente, um Trovador, saiu dando uma “aula” sobre Macartismo e falando em “caça às bruxas”.     
Seu autor esqueceu que, em todas as entidades, literárias, políticas, esportivas, etc., existem órgãos de controle e fiscalização. Seu autor esqueceu que, quando um fato irregular ocorre, deve ser corrigido, até por que , no mínimo, prejudicou alguém. Seu autor não sabe que tivemos, em pouco tempo, três casos que foram devida e sigilosamente, resolvidos, preservando Trovadores (as), Seções e Concursos. Sem nenhuma “caça às bruxas”!

- Depois um outro email, reproduzido em um jornal da Trova, fala na “mesmice” dos Concursos e diz que: - “Os Trovadores fogem das Trovas Líricas e Humorísticas”, e que preferem “fazer Trovas Filosóficas com ideias comuns”.

O autor não deve estar acompanhando o que ocorre nos Concursos e/ou Jogos Florais! Entre 2007 e 2008 tivemos 13 ou 14 Concursos Humorísticos ou seja, entre 150 e 250 Trovas Humorísticas premiadas e publicadas. Ainda neste período, quase 70% das Trovas classificadas em Concursos e Jogos Florais, eram Líricas! Tudo isto considerando que há Concursos com Temas que, praticamente, não aceitam o Lirismo: Tradição, Academia, Samaritano, Brasil, Ecologia, Agricultura, Tribunal, Fraternidade, Reis Magos, Natal e outros. Depois se estende em falar sobre a “falta de renovação”, mas, fala, fala e não apresenta uma solução.

É como se eu falasse sobre o trânsito caótico e congestionado de São Paulo, e poderia fazê-lo por horas a fio, mas não desse nenhuma sugestão para resolver o problema.

– Agora, um trabalho de três páginas, sobre uma Trova premiada em Campos, rimando: moral com pau. O autor argumenta sobre a pronúncia, dando como exemplo a pronúncia de ambos como aw, isto é usando o W como base.   

Com certeza não conhece o Rio Grande do Sul, onde o L é L mesmo e onde Walter tem som de V. Diz que “hoje somos o único grupo literário coeso que usa de uma forma fixa”, e, eu pergunto: Não será por isso que, há mais de 60 anos, o Concurso de Quadras de São João, do Jornal de Notícias, no Porto, Portugal, recebe, anualmente, mais de 5.000 Quadras?

Afinal, os poetas continuam a fazer seus sonetos decassílabos ou alexandrinos e estes seguem sendo expoentes da poesia clássica. Esperando que as “atualizações” ou “modernizações”, seja lá como queiram chamar, não obriguem as Comissões Julgadoras a abrir os envelopes das Trovas premiadas, antes de defini-las...

–“Ah! Este é, gaúcho, rima tal com mal. Está certo!”
- “Ah! Este é, carioca, rima tal com pau. Está certo!”
- “Ah! Este é mineiro, conta rio como dissílabo. Correto!”
-“Ah! Este é gaucho, conta tio como monossílabo. Certo!”      


Com certeza seria bom que alguns Trovadores lessem o artigo “Recados da China”, de Ivan Angelo, publicado na “Veja São Paulo, de 15/04/2009.     

Para finalizar, pode ser que eu esteja enganado mas, a Trova do Nélio Bessant, não seria premiada, em Porto Alegre, em São Paulo, no Rio de Janeiro, em Niterói, em Belo Horizonte ou em Nova Friburgo, só para citar alguns dos Concursos e Jogos Florais realizados no Brasil.      
Cremos que é preciso “pensar” mais no que se vai “digitar”; cremos que é hora de “pensar” mais na Trova; cremos que é tempo de buscar toda e qualquer atividade que divulgue a Trova e possa colaborar com a “renovação” dos nossos quadros.
 
Fonte:
Texto integrante da apostila Oficina de Trovas, de Izo Goldman.

segunda-feira, 8 de março de 2021

Alvitres do Professor Renato Alves - 5 -


20.

O rio vem correndo tranquilamente... De repente, acelera, agita-se, e nos oferece o imponente espetáculo visual da queda d’água. Logo adiante, retoma a calma e continua seu curso...            

Vejam como a sensibilidade do poeta nos conta  isso através de uma linda trova!
    
Vestem-se as águas de prata,
saltam no espaço vazio.
Findo o show da catarata,
sereno refaz-se o rio...
( A. A. de Assis)

 
21.
No poema “A  um  poeta”,  Olavo Bilac  retrata o trabalho exaustivo que é escrever. Ressalta, porém, que, pronta a obra, este trabalho não deve ser percebido pelo leitor (“...que na forma se disfarce o emprego do esforço...”).  A mesma ideia parece estar presente na trova de Adelmar: “tão fácil, depois de feita, / tão difícil de fazer...”.

Certamente é também a este esforço que se refere a expressão “dura prova” na trova de Jotagê.
 
Ao ler uma bela trova
depois que pronta ficou,
quem calcula a dura prova
por que o poeta passou?
(J. G. de Araújo Jorge)
 
22.
Diz-se que “o Perdão traz mais bem-estar espiritual a quem perdoa do que a quem é perdoado”...

O perdão  ilumina e fortalece o coração do perdoador, capacitando-o a continuar perdoando e, portanto, aprimorando-se espiritualmente, numa espécie de círculo virtuoso.  Veja como o trovador conseguiu traduzir com simplicidade esta ideia, com base nos pares: perdão/luz,  ilumina/eleva,  eleva/perdoa.
 
O perdão é luz na treva
do coração da pessoa.
Quem se ilumina se eleva
e quem se eleva, perdoa!
(Alfredo de Castro)

 
23.
Na trova humorística é mais que conhecida a preferência pela temática da “sogra”, que sofre avassaladora e sistemática gozação.  No entanto, nesta primorosa trova de Sérgio Ferreira da Silva,  a sogra levou a melhor...
 
A minha sogra me deu
um troféu e uma medalha...
e, no diploma, escreveu:
“VENCEDOR – TEMA: CANALHA”
(Sérgio Ferreira da Silva)

 
24.
Às vezes, a repetição (reiteração) pode valorizar muito uma trova. Veja como o uso deste recurso foi fundamental para a ideia central e o efeito humorístico  das trovas abaixo:
 
Ao por-lhe a esmola no prato
pergunta ao surdo, baixinho:
– És mesmo surdo de fato?
E ele: – ”Surdinho, surdinho!”
(Vasques Filho)

Nunca vi almas! – diz rindo.
E o cara na sua frente,
foi sumindo, foi sumindo,
transparente, transparente...
(José Maria M. de Araújo)

domingo, 7 de março de 2021

Cantinho do Assis (Pausa para Reflexão)


Os concursos têm sido muito úteis ao trovismo. Há mais de quarenta anos eles vêm prestando bons serviços: estimulam a intensa produção de trovas; contribuem para o fortalecimento da amizade entre trovadores de todo o Brasil e de Portugal; possibilitam a revelação de novos valores. No entanto, é preciso ter cuidado a fim de que os efeitos não se invertam.

Não se pode permitir de forma alguma o estabelecimento de um divisor de águas – de um lado os ganhadores habituais de concursos e de outro os que jamais (ou raramente) são premiados. Mesmo porque concurso não é a única maneira (e talvez nem seja a mais eficiente) de avaliar poesia ou lá o que seja. Há muitos trovadores que dificilmente aparecem no pódio dos premiados, mas que têm rico acervo de boas trovas. Além disso, a principal característica do trovismo foi sempre a fraternidade, razão pela qual não tem sentido colocar em primeiro plano a disputa de prêmios.

Agrada saber que fulano ou sicrana já receberam dezenas ou centenas de troféus, porém muito mais agrada saber que fulano e sicrana amam a trova tanto quanto nós amamos, e que tal afinidade nos faz irmãos. Se, portanto, algum dia notarmos que os concursos começam a prejudicar a fraternidade, talvez seja melhor acabar com eles, criando novas formas de motivação.

Recordemos as sábias palavras do mestre Reinaldo Moreira de Aguiar: "A trova é um modo franciscano de ser poeta.” Parece que isso resume tudo.

Fonte:
Editorial do Trovia de fevereiro / 2002

Lairton Trovão de Andrade (Descontraindo em versos)

01. Destrua a melancolia, pois a vida se renova! Contra a tristeza, Maria, beba chazinho de trova! 02. O plagiário é caricato que no mundo s...