domingo, 27 de junho de 2021

Antonio Carlos Teixeira Pinto (Brasília/DF)

"Adeus!" - Tu disseste, rindo.
"Não voltes!" - disse eu, depois.
- Dois covardes se agredindo;
morrendo de amor, os dois!...

A funerária vivia
com o movimento bem fraco...
E como ninguém morria,
a firma foi pro buraco!

Ah, por favor, não me peças
promessas, que me pões tonto...
- Quem ama não faz promessas,
entrega-se todo... e pronto!

A noite é de apoteose
pois, no horizonte, o luar
alveja a linha que cose,
ponto a ponto... céu e mar!

Ao voltar antes da hora,
acha a mulher se benzendo...
nem percebe que, lá fora,
seu pijama sai correndo!

A praia estava lotada,
ao surgir a confusão.
Gritaram: “Mulher pelada!”
— E foi aquele arrastão…

A primavera da vida
vi morrer, ardendo em ânsia,
naquela calça comprida
que encurtou a minha infância!

A vigília me tem dado
muita dor... Fazer o quê?!
Passo as noites acordado,
esperando por você!

Com a cachaça proibida,
é xadrez toda semana:
— Como não larga a bebida,
dá  um jeito e “vai em cana”.

Com mulher sempre se alterna
minha sorte, eis a questão
- Quando uma me passa a perna,
outra me deixa na mão!

Como te amei! Fui covarde
em não seguir os teus passos:
quando tentei, muito tarde,
eras manhã noutros braços!...

Covardia é tu dizeres
que minha dor é fingida,
e eu ser, de todos os seres,
quem mais apanha na vida!

De certa caça ele guarda
saudosa recordação,
pois, hoje, a sua espingarda
aponta só para o chão!

Eu como demais, não minto;
e que sede! Bebo bem...
Na verdade, sou faminto
e “sedentário” também.

Eu não consigo, alvorada,
de forma alguma entendê-la:
a cada flor despertada,
ter de morrer uma estrela.

Eu te amo! E ainda perguntas
se há jura em minhas respostas...
Não vês que as nossas mãos juntas
valem mais do que mãos postas?

Eu trouxe tanta saudade,
tanta saudade deixei,
que há um dilema de verdade:
será que eu vim, ou fiquei ?!

É vigarista atuante,
faz do xadrez o seu lar;
é réu “primário”, garante,
só  fez o Grupo Escolar…

Faltou-me talvez coragem,
e, por medo de chorar,
não abri sua mensagem.
- E ela queria voltar...

Fibra, amor, eu tive um dia:
foi triste a separação...
- Apertei-te a mão vazia
e enchi de adeus minha mão!

"Isso é hora de chegar?!
E molhado!..." - ela reclama.
"por que não dormiu no bar?"
"Vim pegar o meu pijama".

Já temendo um desengano,
fui ver meu circo de outrora:
saí por baixo do pano
e vim chorar aqui fora!

Minha mãe não teve escola,
sempre a lutar, noite e dia,
mas a vida lhe deu cola
de toda a sabedoria!

Minha vigília, querida,
não é por falta de sono,
é o preço que impõe a vida
pelas noites de abandono.

Não sei, covardia ou não,
se alguém faria o que fiz:
- Abrir mão da tua mão,
para que fosses feliz!...

No corpo-a-corpo com a vida,
em combates desiguais,
e mesmo de alma ferida,
não me acovardo jamais!

No meu prédio, o rebuliço
ganha maior consistência,
quando a entrada de serviço
é saída de emergência !

Nossas letras iniciais,
no centro do coração,
também são restos mortais
de um carcomido portão!

Nosso amor é um retrocesso,
pelo orgulho que nos cega:
- eu desejo... mas não peço;
ela quer... mas não se entrega.

Nosso amor já não importa,
pois fizeste a covardia
de fechar a tua porta
a quem os braços te abria!

Num ato de covardia,
ela, de mim já bem farta,
beijou-me, enquanto partia,
e mandou-me o adeus por carta!

Num enterro de segunda
houve tanta confusão
que uma parte da Raimunda
foi por fora do caixão...

O abandono era patente,
no abraço da solidão:
- duas voltas de corrente
num velho e tosco portão...

Olho o portão .. vejo as horas
nem sei há quanto te espero,
ansioso - porque demoras,
sofrendo - porque te quero!

Passou na cadeia um mês...
E, com saudades da cela,
veste-se, hoje, de escocês
e pôs grade na janela.

Ponho fora os meus cansaços,
a vigília a me nutrir,
pois, quando a tenho em meus braços,
como é que eu posso dormir?!

Por mais que seja insensata
minha forma de viver,
bendigo a dor que me mata,
mas deixa o verso nascer...

Pudesse, mãe, a lembrança
recompor o antigo lar...
Eu -- voltar a ser criança;
você... somente voltar!

Quando é bem forte a topada,
quem puder que fique mudo...
- É melhor não falar nada
que dizer... aquilo tudo!

Quando em cismas eu mergulho,
dando um balanço na dor,
ponho na conta do orgulho
minha falência no amor!

Queria vencer na vida,
só faltava um "empurrão"
que veio... em plena Avenida,
na frente de um rabecão!

Ruínas, teias de aranha,
o silêncio do quintal...
Se esta dor não me acompanha,
o abandono era total...

Se era uma fuga a viagem,
fui mais covarde na hora:
- a saudade, na bagagem,
não deixou que eu fosse embora!

Se tu jamais foste minha,
se nunca fui teu também,
posso ir só, que irás sozinha...
Ninguém perde o que não tem!

Seu adeus, naquela hora,
revelou-a para mim:
- quem quer de fato ir embora
não bate o portão assim!...

Tinha no olhar tanto brilho,
tal força nos firmes passos,
que não carregava um filho:
- levava o mundo em seus braços!...

Toda a minha teimosia
em me calar, foi em vão,
porque, na Delegacia,
me deram voz... de prisão

Topada feia! Pois é...
não tive colher de chá:
- o dedão veio no pé,
mas a unha... ficou lá!

Trouxe-me a brisa, bem mansa,
uma canção de embalar...
Com ela veio a criança
que a saudade foi buscar!

sexta-feira, 25 de junho de 2021

Jeremias Ribeiro dos Santos (Gentio do Ouro/BA, 1926 - 1999, Ipupiara/BA)

 1
Alma e valor não traduz
o nosso Eu exterior,
mas reflete Amor e Luz,
o que somos no interior.
2
A mulher boa e fiel
tudo pelo esposo faz,
faz do seu lar um dossel,
um trono de amor e paz.
3
Brasil: a tua pujança,
teu progresso está seguro
em quem agora é criança
– o Bacharel do futuro.
4
Com o Livro de Deus aberto,
a ler, com meditação,
encontro paz e, por certo,
do meu viver a razão.
5
Ditoso e mui sorridente
vou brandindo a minha lira
e adornando a minha mente
com os versos que Deus me inspira.
6
Em Carlos Ribeiro Rocha
sempre encontro inspiração,
seus versos – são uma tocha
de rara fulguração.
7
Eu não sei filosofar,
isso é coisa de doutor,
mas às Letras sei amar,
e ao Belo sei dar valor.
8
Faço da trova um poema
para louvar mãe Maria,
nome que adoro e é meu tema
quando teço a poesia.
9
Luta, sofre, evita o mal,
da sorte nunca maldiz,
a esposa boa, ideal,
que quer ver seu lar feliz.
10
Nas asas fortes da trova,
mando a cada trovador
um aperto de mão, que prova
a força do nosso amor.
11
Nas letras não sou perfeito,
primária é minha instrução,
em Deus, porém, no infinito,
acho a luz da inspiração.
12
Nesta vida transitória,
nada vejo de valor,
pois, daqui, a falsa glória
murcha e finda como a flor!
13
Num mais notável poema,
é que se traduz a trova…
Ela encerra ilustres temas,
e – ao gênio – inspira e renova…
14
O que dizer eu não sei,
diz por mim a Poesia,
que é da harmonia a lei,
a tradução da alegria.
15
O teu meigo coração
pulsa, mamãe, junto ao meu,
e eu sinto na vibração
desse amor – o amor de Deus!
16
O trinômio que me  induz
a sonhar felicidade,
pensar nos Andes, na Luz,
é – Deus, Poesia, Verdade!
17
Para a festa da Poesia
algumas “faíscas” trago,
que dedico à mãe Maria
e aos amigos do meu pago.
18
Por dar ouvido à Serpente,
perdera seu Paraíso
o casal, que tão contente,
nos lábios tinha um sorriso…
19
Pra Ti, Mestre e Benfeitor
Jesus, quero poetar…
Com desvelo e  vivo ardor,
nos meus versos Te exaltar…
20
Qual soluça a juriti
que um dia perdeu seu ninho,
soluço longe de ti,
vivendo sem teu carinho…
21
Quisera ser trovador,
para com arte e mestria,
brilhantes trovas compor
louvando mamãe Maria.
22
Sejam meus ou sejam teus,
em apenas quatro versos
cabem fulgores dos céus
e a grandeza do Universo…
23
Sob o comando de Deus,
do Universo o Construtor,
breve o mundo de escarcéus,
será um mundo de amor.
24
Trova – criação divina,
apara alegrar os humanos,
– joia em versos, que fascina
os novos e os veteranos.
25
Tu és nobre e tens riqueza…
Eu sou pobre e sou plebeu…
Por tua pompa e grandeza
não troco um só verso meu.
26
Vaguei triste a procurar
remédio pro meu sofrer…
Só na trova pude achar
cônscio, alívio e prazer!

quinta-feira, 24 de junho de 2021

Oficina de Trovas do Assis

 Trova é isto: uma sequência de 28 sons, ou seja, 28 notas musicais, formando um poema composto de quatro redondilhas maiores.

Entende-se por redondilha maior o verso setissílabo, provavelmente o mais antigo modo, ou pelo menos o modo mais natural de transformar palavras em música. Uma escala musical completa: dó-ré-mi-fá-sol-lá-si...

A redondilha está na boca e no ouvido do povo, em todas as línguas, desde que o homem e a mulher aprenderam a emitir sons vocais.

Está nos ditados populares:

- Quem tem boca vai a Roma.

- Filho de peixe é peixinho.

- Quem nasceu pra lagartixa / nunca chega a crocodilo.

- Agua mole em pedra dura / tanto bate até que fura...

 
Está nas cantigas de roda:

- Oh ciranda, cirandinha / vamos todos cirandar...

- Meu limão, meu limoeiro, / meu pé de jacarandá...

 
Está na declamação das crianças:

- Batatinha quando nasce / se esparrama pelo chão... / Batatinha quando cresce / vira um baita batatão...

 
Está na música popular de modo geral:

~ Toda vez que eu viajava / pela estrada de Ouro Fino...

- Fica comigo esta noite / e não te arrependerás...

Está na linguagem bíblica:

- Deus criou o céu e a terra / e viu que tudo era bom.

- Pai nosso que estás no céu / santificado é o teu nome...

Técnica

Aqui não cabe um estudo pormenorizado sobre técnicas de versificação. Vale, entretanto, lembrar que a trova, como as demais modalidades de poesia, tem normas a serem obedecidas. O trovador necessita, sobretudo, estar atento às questões da rima e da métrica.

 RIMA

 A rima, segundo as normas atuais, como já vimos, deve ser dupla, isto é, devem ser rimados o primeiro verso com o terceiro e o segundo com o quarto (abab). Em trova não há, porém, grande exigência quanto ao fato de a rima ser rica ou pobre, no sentido tradicional de que rica seria a rima entre palavras de diferentes categorias gramaticais: verbo com substantivo, adjetivo com advérbio etc. Isso não tem sido levado muito a sério atualmente. Mais importante é o trovador estar atento para evitar certos cochilos que, estes sim, enfraquecem o verso. Por exemplo:

 rimas com palavra derivadas: ver / rever; agir / reagir; tempo / contratempo.

 rimas imperfeitas, assim chamadas por haver diferença no timbre das vogais tônicas:

ideia / areia; sacode /pôde; melhor /favor.

rimas regionais: há, por exemplo, quem pronuncie /friu/, /riu/, num único som, rimando com "viu", em vez de /fri-o/, /ri-o/, em dois sons, como recomenda o Decálogo de metrificação adotado pela UBT.

rimas homófonas, em que a vogal tônica seja a mesma - e com o mesmo timbre – nos quatro versos (sem que haja sons internos fortemente contrastantes), como nestes exemplos inventados:

 Moda nova quando nasce
já se espalha pela praia;
porém logo ela desfaz-se
se outra moda entra na raia.
 
Tenho uma rede e uma esteira
no meu rancho de sapê;
e uma roseira faceira
que plantei para você...
 
Fiz que fiz, fiz que não fiz,
fiz do jeito que farias.
Se o que fiz te faz feliz,
faço assim todos os dias!

  MÉTRICA

(Estudo com base no Decálogo de Metrificação de Luiz Otávio, adotado pela UBT) 
 

1) As sílabas são contadas até a última tônica do verso.

Poderá a força etrica 
de um sábio computador 
ensinar contagem trica 
mas não faz um trovador...
 
- relâmpagos e trovões 
- esta vida é passageira 
- o canto alegre dos ssaros 
 

2) As pontuações não impedem as junções de sílabas.

Pensa em calma! Evita errar, 
injusto é se nos reprovas, 
pois não queremos mudar 
o modo de fazer trovas.
 
 - Moça que sonha, escondida,
- Que pena... ela foi-se embora
- Vou dizer-te: avida é bela

3) Não se deve aumentar uma sílaba métrica nos encontros consonantais disjuntos. Ou seja: deve-se evitar suarabactí (não pronunciar "letra muda").

Podes sempre acreditar, 
ter a pura con / vic / ção 
de que não vou te obrigar 
a ter a minha opinião...

 (Na contagem métrica, pronuncie "convição”, não "con/vi/qui/ção”)

 - Danço no rit / mo do samba ("rimo”não "rí / ti / mo") 
- Que muda o as / pec / to das coisas ("aspeto”  não "as /pé / qui / to")
- Subs/ tantivos e ad/jetivos (“sus”, não "su/bis... ; a/je”, não a/di/je...") 
 

4) Uma vogal fraca faz junção com a vogal fraca ou forte inicial da palavra seguinte.

Podes crer, és muito injusto 
e estás íonge da verdade; 
pois na trova a todo custo 
defendo aespontaneidade...
 
- "Onde canta osabiá" 
- "num ranchinho àbeira-chão" 
- e é bom que estejas presente

Observação - Aceitam-se exceções a esta regra no sentido de evitar a formação de sons duros e desagradáveis. Exemplo: "cuja ventura / única consiste" (venturúnica)

 
5) Uma vogal forte pode, ou não, fazer junção com vogal fraca da palavra seguinte, no entanto, jamais deve juntar-se com vogal forte.
 
É u/ ma história bem correta,
porquanto o ensino é preciso,
e no entanto só poeta
quer ser gênio de improviso...
 
 - No Para / aspessoas
 - No Para / ná as / pessoas
 - No Para / pessoas

 Observação - Nos casos em que se prefira a junção "forte + fraca", deve-se ter sempre o cuidado de evitar sons desagradáveis ("mais que tu/ardo") ou formar novas palavras ("via” ao invés de "vi a...").

  
6) Pode haver a junção de três vogais numa sílaba métrica.

§ 1° - Não deve haver mais de uma vogal forte.

§2" - No caso em que a vogal forte não esteja colocada entre as vogais fracas e sim em 1" e 3° lugar, para que seja correta a junção as duas vogais fracas devem juntar-se por crase ou por elisão, e não por sinalefa (ditongação). Assim, estará certo: "é / a am/ bição que nos prende"; (ou) "é a am/ bição que nos maltrata". Mas não podemos unir as três vogais de "e a / ín / tima palavra derradeira".

Es / taé u/ ma regra indiscreta,
convenções mal-amparadas:
induzem muito poeta
a convicções enraizadas.
 
- Ela / e eu/ juntos no cinema
- Ho / je eu/ dis / se a al/ guns amigos
- Coloquei- / lhe o a / nel no dedo
 
7) - As junções com vogais fracas são aceitas nos ditongos crescentes  (/ e eu /), mas são repelidas nos ditongos decrescentes ("Eu sou / aque no mundo anda perdida").
Para medir nossos versos,
se o ou / vido fosse o juiz,
em nossos metros diversos
ninguém poria o nariz...
 
- Devi / do àau/ sência dos noivos
- A inteligên / cia in / fantil
- Os belos montes / da Eu/ ro / pa
 
8) Nos encontros vocálicos ascendentes (formados por vogais ou semivogais átonas seguidas de vogais ou semivogais tônicas), a ditongação (sinerese) é de uso facultativo:
 
ci / ú/ me, ciú/ me;
vi / a / gem, via/ gem;
cri / an/ ça, crian/ ça;
po / e / ta, poe/ ta).
 
Na trova, soneto ou poe/ ma,
em toda parte do mundo,
se a forma for o dilema
su / a / al / maé sempre o fundo!
 

Observação 1 - Há nesse grupo alguns encontros vocálicos que não aceitam a ditongação:

Sa / a / ra, fe / é/ ri / co, a / é/ reo, pa / ra / í/ so, ra / í/ zes,   ba / ú, sa / ú/ va etc.

 
9) - Nos encontros vocálicos descendentes (formados por vogais ou semivogais tônicas seguidas de vogais ou semivogais átonas) não se aceita a ditongação (tu / a, su / a, lu / a, gui / a, fri / o, ri /o, pa / vi / o, sa / di / o etc.

§único - Em algumas regiões do Brasil é usada a ditongação nesses encontros vocálicos, com base na fonética local. No entanto, não será aceita na metrificação, em benefício da uniformidade, uma vez que na maioria dos estados é feita a separação dessas vogais.

As dúvidas são pequenas
não sejas tão pessimista,
dá-me a tu / aajuda, apenas,
e será bela a conquista.
 
10) Recomenda-se evitar formas reduzidas, que, por estarem em desuso, possam ferir a sensibilidade dos leitores e dos ouvintes (mui, inda, co'a etc.),
 
Observação 1 - A junção de "com" com palavras iniciadas por vogais tônicas não é recomendável ("com / es/ ta", não "com es/ta).
 
Observação 2 - A forma "pra" tem sido aceita com naturalidade, especialmente em trovas humorísticas.
 

OBSERVE:

Fi /ca / co / mi /go es/ ta / noi / te

e / não / te a/ rre /pen / de / rás...

Lá / fo / ra o/ fri / o é um / a / çoi / te,

ca / lor / a /qui / tu / te / rás.

Adelino Moreira

 

Eu / nas / ci / na / que / la / se / rra,

num / ran / chi / nhoà/ bei / ra- / chão,

to / do / chei / o / de / bu / ra /co,

on / de a / lu / a / faz / cla / rão...

Angelino de Oliveira

 

Se / re / nô, / eu / ca / io, eu/ ca / io;

se /re /nô, / dei / xa / ca / ir...

se / re / nô / da / ma / dru / ga / da

não / dei / xou / meu / bem /dor / mir...

Antônio Almeida

 

Es / ta / vaà/ to / a / na / vi / da,

o / meu / a / mor / me / cha / mou

pra / ver / a / ban / da / pa / ssar

can / tan /do / coi / sas / de a / mor...

Chico Buarque de Holanda

 

Pe / guei / um / I / ta /no / Nor / te

pra / vim / pro / Ri / o / mo / rá...

A / deus, / meu / pai, / mi / nha / mãe;

a / deus, / Be / lém / do / Pa / rá!

Dorival Caymi

 

Pre / pa / re o / seu / co / ra / ção

pras / coi / sas / que eu / vou / contar.

Eu / ve / nho / lá / do / ser / tão,

e / po / sso / não / lhe a / gra / dar...

Geraldo Vandré

 

Na a / la / me / da / da / poe/ si / a,

cho / ra / ri / mas / o / lu / ar...

Ma / dru / ga / da... e A / na / Ma / ri / a

so / nha / so / nhos / cor / do / mar...

Juca Chaves

 

Es / te é/ o e / xem / plo / que / da / mos

aos / jo / vens / re / cém- / ca / sa / dos:

queé/ me / lhor / se / bri / gar / jun / tos

do / que / cho / rar / se / pa / ra / dos...

Lupicínio Rodrigues

 

Quan / do es/ tou / nos / bra / ços / teus,

sin / to o/ mun / do / bo / ce / jar...

Quan /do es/ tás / nos / bra / ços / meus,

sin / to a / vi / da / des / can /sar!

Luiz Vieira

 

O / no / sso a/ mor / tra / du / zi / a

fe / li / ci / da / de, a /fei / ção,

su / pre / ma / gló / ria / que um / di / a

ti / ve ao / al / can / ce / da / mão.

Mário Rossi

 

Mui / ta / gen / te / cai / à/ to / a,

ou / tros / ca / em/ com /  Ra / zão...

A / sau / da / de é u / ma / ga / roa

ca / in / do / no / co / ra / ção.

Roberto Martins

 

O / lho o / sol / fin / dan /do / len / to,

só / nho o / so / nho / de um / a / dul / to:

mi / nha / voz / na / voz / do / ven / to

in / do em / bus / ca / do / teu / vul / to...

Sérgio Bittencourt

 

Eis / a / qui/es/ te / sam / bi / nha

fei /to / de u / ma / no / ta / só...

Ou / tras / no / tas / vão / en / trar,

mas / a / ba / se é/ u / ma / só...

Tom Jobim

 

Um / ve / lho / cal / ção / de / ba / nho,

o / di / a / pra / va / di / ar...

Um / mar / que / não / tem / ta / ma / nho

e um / ar / co– / í/ ris / no / ar.

Vinícius de Moraes

 
Fonte:
Apostila da Oficina de Trova ministrada pelo trovador na Feira Literária Internacional de Maringá (FLIM)

quarta-feira, 23 de junho de 2021

Maria Thereza Cavalheiro: O Bom Trovar (IV - O que evitar)

 

Embora alguns autores entendam que o enjambement possa dar realce a certas palavras, somos de opinião que deve ser evitado na trova.

Enjambement é quando palavras que pertencem ao grupo tônico de um verso, à sua unidade, passam para o verso seguinte, onde completam o sentido, muitas vezes com prejuízo para o valor da rima.

Ex:
Seguimos pela estrada
da vida, com nossas mãos
unidas; etc.

Versos sibilantes, com muito s e z, podem ser desagradáveis:

Fez-se mais triste depois.
Sentiu-se assim mais sincero.
Sem sentido se exaspera.

Evite-se a colisão, que é o encontro de sons iguais ou semelhantes também com efeito acústico reprovável:

Pois esse se separou.Foi um dardo do destino.

Sons duros seguidos devem ser evitados:

Foi ele que quis o amor.
Quer quanto vale um tesouro.
Ninguém tem amor à dor.

No último exemplo houve também um cacófato:

morador.

É bom ler em voz alta nossas trovas, para detectar possíveis cacófatos, que é quando do encontro de sons em uma frase resultam palavras ridículas, estranhas ou simples efeito desagradável ao ouvido.

Na humorística, às vezes o cacófato é usado de propósito, para um efeito que leve à hilaridade.

Eis alguns cacófatos corriqueiros:

em festa - infesta;
mas não - asnão;
só com - soco;
se enterra - sem terra;
vez passada - vespa assada;
ela tinha - é latinha;
em versos - inversos;
uma mão - um mamão;
por causa - porca;
da nação - danação;
mas que - masque;
compus - com pus;
amor tem - a morte em;
tu me amaste - tu mamaste;
alma minha - maminha.

Quanto ao uso de nomes próprios na trova, embora comum, somos de opinião que deve ser evitado, mesmo na quadra humorística. Só se justifica em trovas de homenagem. Fazemos exceção para o nome Maria, quando designa mulher, e sem ter sentido pejorativo.

Como no exemplo:

Por duas Marias erra
meu viver de déu em déu:
- a que me perde, na terra,
- a que me salva, no céu.
J. G. DE ARAÚJO JORGE

Na trova, devem ser evitados certos recursos para dar ao verso o número de sílabas, as chamadas cavilhas, que são palavras de apoio para completar a frase melódica, tais como:

meu bem, querida, meu amigo, meu rapaz, eu suponho, todos sabem, todos dizem, creia, acredito, veja bem.

Na maioria das vezes, essas expressões nada acrescentam à trova. Mas pode ocorrer também de serem bem empregadas, como no exemplo seguinte:

Quando à festa vens, querida,
em minha casa modesta,
a festa ganha mais vida
e a vida ganha mais festa!
ANTÔNIO ZOPPI

Evite-se, também, o estrangeirismo - uso de palavras e construções estranhas à nossa língua.

Cuidado com o eco - fonemas que se repetem no verso sem nenhum intento específico de valorização da trova.

Atenção especial com os erros de gramática.

Solecismo é, em sentido lato, toda e qualquer infração cometida contra a língua pátria. É muita pena quando uma bela trova apresenta lapso gramatical. O poeta deve dominar os seus meios de expressão.

Achamos de muito mau gosto fazer pilhéria sobre infortúnios ou ridicularizar pessoas em razão de credo, raça e sexo. Infelizmente, a trova humorística presta-se muito a isso. A mulher, principalmente, é bastante visada. Faz-se piada com a sogra, a velha, a empregada, a grávida, a mulata.

Zombar de alguém em nada contribui para a melhoria do mundo, que necessita de mensagens fraternas.

Fonte: CAVALHEIRO, Maria Thereza. Trovas para refletir. SP: Ed. do Autor, 2009

terça-feira, 22 de junho de 2021

Maria Thereza Cavalheiro: O Bom Trovar (III - Figuras na Trova)

 

A trova se valoriza pelo achado, pelo inusitado - algo que surpreende no momento da criação. É uma nova forma de dizer o que já foi mil vezes dito; uma ideia diferente para expressar alguma coisa comum. Pode ser um jogo de palavras, uma metáfora, uma rima original. O achado é uma descoberta.

Como elementos de valorização da trova, merecem atenção especial as figuras de estilo, recursos que dão ao verso maior colorido e fulgor.

Elas são muitas e se dividem em figuras de palavras (ou tropos), figuras de pensamento e figuras de construção.

Entre as figuras de palavras, temos
 a metáfora (e suas modalidades, como personificação, símbolo, sinestesia),
 a comparação e a metonímia.

Entre as figuras de pensamento, estão
 a antítese ou contraste,
 o paradoxo,
 o eufemismo,
 o trocadilho.

Entre as de construção temos
 a onomatopeia,
 a aliteração,
 a elipse,
 a reticência,
 a repetição.

Muitas vezes esses termos se confundem e simplificadamente são chamados de figuras, imagens ou metáforas em sentido lato.

Na metáfora, em sentido estrito, a imagem se revela por si só, de modo implícito. Sem nenhum suporte para sua expressão, o que a torna mais viva e dinâmica que na comparação. Assim:

Muitas vezes imagino,
nos meus dias desolados,
que o meu coração é um sino
dobrando sempre a Finados.
BELMIRO BRAGA

Faz contraste com o céu
o pinheiro verdejante;
é uma taça erguida ao léu
em louvor do caminhante!
MAFALDA DE SOTTI LOPES

No ocaso, em tarde sombria,
que à saudade nos conduz,
a sombra é o pranto do dia ,
chorando a ausência de luz.
FERREIRA NOBRE

Disse-me a fonte na mata,
nos ternos cânticos seus:
- O Poeta é a flauta de prata,
o Poema - o sopro de Deus!
LEONARDO HENKE

Na comparação ou símile, a imagem se revela com auxílio das palavras como, tal como, tal qual, qual, parece, e, por ser explícita, perde em geral um pouco de sua força. Eis um exemplo:

Meu coração, quando o ninas
com tuas juras de amor,
parece um templo em ruínas
todo coberto de flor!
LILINHA FERNANDES

Personificação, que também é denominada prosopopéia, animismo e animizaçâo, é a figura de linguagem em que seres inanimados ou irracionais agem como se fossem seres humanos:

Ao sol, as rosas vermelhas,
sensuais, tontas de luz,
à carícia das abelhas,
vão expondo os colos nus!
JOUBERT DE ARAÚJO SILVA

Símbolo é quando se toma, sistematicamente, uma coisa, de valorização universal, por outra, a exemplo de cruz, que pode simbolizar o Cristianismo, a dor, a morte; ou regaço, que pode referir-se a colo materno:

A vida é apenas um traço
com jogos de sombra e luz,
que partindo de um regaço
vai terminar numa cruz.
VERA VARGAS

Sinestesia é quando se confundem os planos sensoriais, usando-se de um sentido por outro, para um determinado efeito. Como nos versos:

Vê-se o canto da araponga.
Ouve-se a luz da manhã.
Enxerga-lhe a cor da voz.

Metonímia é quando se diz uma coisa por outra, o efeito pela causa e vice-versa:

cãs, por velhice;
primaveras, por anos;
suor, por trabalho.

É bastante comum na trova e a enriquece sobremaneira:

As cãs mostravam o tempo.
Na primavera da vida.
Suores de muitos anos.

Na antítese ou contraste, juntam-se ideias opostas pelo sentido:

Trouxe-me grande valia
a verdade que aprendi:
toda pessoa vazia
é sempre cheia de si...
DELMAR BARRÃO

No paradoxo, as ideias são contraditórias, a sugerir erro, mas podendo conter uma verdade:

Meu olhar vago relata,
numa tristeza incontida,
que o grande amor que me mata
é o mesmo que me dá vida.
LEOPOLDINA DIAS SARAIVA

Quando preso num recinto,
desejo livres espaços.
Porém, mais livre me sinto
quando preso nos teus braços.
MÁRIO BARRETO FRANÇA

O eufemismo é uma maneira de suavizar uma realidade desagradável, é quando se diz uma coisa por outra menos contundente:

Foi para o mundo estelar - faleceu.

No trocadilho, há palavras de sons semelhantes e sentido aparentemente dúbio, às vezes com o intuito de fazer graça:

Foste uma flor de papel / fazendo papel de flor.

Na elipse, um ou mais termos ficam subentendidos na frase:

Rosa é flor, também mulher.

Na reticência, há uma suspensão propositada do pensamento:

Era um amor sem controle...

Repetição é quando se usa uma expressão por mais de uma vez, para o efeito de realce:

Branca a nuvem, branca a paz.

A onomatopeia e a aliteração, termos que muitas vezes se confundem, podem trazer muita originalidade à trova.

Aliteração é a repetição de fonemas iguais ou parecidos para, através do som, sugerir uma ideia:

Onda redonda assomou.

A aliteração aproxima-se muito da onomatopeia, que, em sentido estrito, é quando um único vocábulo dá a ideia acústica:

o marulho das ondas,
o farfalhar das ramagens.

Em sentido lato, a onomatopeia refere-se a todos os processos e efeitos que levem a sugerir um determinado ruído.

Bate o vento, o vento bate.

A assibilizaçâo (sons sibilantes, excesso de s e z), que normalmente se condena, pode também servir à aliteração:

Zunem com asas de brisa.

Várias imagens podem aparecer com frequência em uma mesma trova, e seus nomes também muitas vezes se confundem.

Fonte: CAVALHEIRO, Maria Thereza. Trovas para refletir. SP: Ed. do Autor, 2009

Lairton Trovão de Andrade (Descontraindo em versos)

01. Destrua a melancolia, pois a vida se renova! Contra a tristeza, Maria, beba chazinho de trova! 02. O plagiário é caricato que no mundo s...