terça-feira, 25 de abril de 2017

Alba Christina Campos Netto


1
A dentadura escorrega,
mas depois de muito estudo,
agora, em vez de corega,
ele passa cola-tudo.
2
A festa já estava brega
quando a ilustre convidada,
gingando a saia de prega,
escorrega e cai sentada!
3
Ante os preços, toma um porre,
e a quem lhe diz que isso é um erro,
responde que só não morre
por não ter grana pro enterro.
4
“A onça entrou no terreiro
e sua mulher tá lá!”…
Responde o peão, matreiro:
“deixa onça se daná!”…
5
As mentiras bem montadas
que me dizes com prazer,
são algemas desgastadas
que eu teimo em não desprender
6
Brigamos,mas a saudade,
inconformada, ergue a chama
nos abajures de jade
que guardavam nossa cama.
7
Brigas de amor têm segredos,
e eu juro que me comovo
ouvindo os nós dos teus dedos
batendo à porta de novo...
8
Depois de encher nosso quarto
desse gozo em que se esmera,
você parte, e eu me reparto
nos delírios de outra espera.
9
Em momentos exaltados
sem poder falar e agir,
o silencio dá recados
que poucos sabem ouvir.
10
Fui lembrar nosso namoro,
e pelo jardim, os gnomos
juntaram-se a mim no coro
das lembranças do que fomos.
11
Gastou no terno e gravata
todo o dinheiro que tinha.
Que frustração, pois a gata
só queria a camisinha.
12
"Há uma loura acompanhando
seu marido o dia inteiro..."
- Pois vai acabar cansando...
O meu marido é carteiro!
13
Indiferente partiste,
sem adeus, nem emoção,
sem remorso, e o que é mais triste,
nem sentiste o meu perdão.
14
Letras feias, mal impressas,
e o descuido peculiar
de quem, convidando às pressas,
sabe que eu não vou faltar...
15
Meu destino é um desatento
marinheiro em fantasias,
baixa as velas quando há vento,
e a solta nas calmarias.
16
Meu sonho é ilusão ligeira
que achando a fresta perdida,
faz a dança da poeira
nos raios de sol da vida...
17
Meus sonhos em revoada
foram-se embora, e eu me sinto
andorinha desgarrada
no meu verão quase extinto.
18
Morre o sonho, e as nossas vidas,
antes, caminhos iguais,
são duas trilhas perdidas
que não se cruzam jamais.
19
Não podendo compreendê-las,
apaguei as fantasias,
sem saber que eram estrelas
nas minhas noites vazias.
20
Não quis te assustar, de fato,
nem causar esse desmaio.
Vi o frango inteiro em teu prato,
então gritei: "Papagaio"!!!
21
Nas armadilhas da vida
às vezes, o amor mais lindo,
dá seu recado, e em seguida,
manda um outro, desmentindo.
22
Nas leis com que nos afagam
a confusão é tamanha,
que todos sabem que pagam
mas ninguém sabe quem ganha.
23
Nas nossas vidas truncadas,
juntos, sem sonhos nem crença,
mãos dadas, ou separadas,
já não fazem diferença...
24
No jantar, foi fim de papo
quando a esnobe tão segura
foi atrás do guardanapo
que levou-lhe a dentadura.
25
No quarto, vazio agora,
nosso velho cobertor
cobre as mentiras que outrora
foram delírios de amor...
26
Noites frias, inclementes,
sopro a vela, penso em ti,
e durmo nas cinzas quentes
do amor que eu nunca esqueci.
27
Num sorriso, e sem aviso,
eu te espero, e quem me dera
desta vez o meu sorriso
continuasse além da espera...
28
O jardim, feito em meandros
é o teu refúgio e o lugar
onde meus olhos malandros
não cansam de te espreitar.
29
O que eu fiz de mais errado
nos meus momentos instáveis,
foi não ter desabafado
tantas mágoas reparáveis...
30
Para o poeta, é verdade,
os temas não são problema...
o amor, o sonho e a saudade
cabem sempre em qualquer tema.
31
Perdão de amor é incerteza,
é aquela pedra em desvio
que segura a correnteza
mas não traz de volta o rio.
32
Pergunta em sã criancice
quando a visita aparece:
com que bicho o papai disse
que essa mulher se parece?
33
Preciso de um tratamento,
um remédio que me ajude
a não sofrer com o aumento
do meu plano de saúde.
34
Quando um grande amor se afasta
deixa uma nota escondida
na canção que o vento arrasta
nas folhas secas da vida.
35
Quantos anos dá pra mim?
diz vaidosa, e com desdém,
o galã responde assim:
já não chegam os que tem?
36
Quase inverno... sem escolhas
eu vejo o outono passar
levando as últimas folhas
que teimam em me abraçar.
37
Quebro a taça do passado
e o vinho espalhado ao chão
é meu brinde apaixonado
aos cacos de uma ilusão.
38
Revivendo meus espinhos
fiz descoberta assombrosa,
nunca vieram sozinhos,
trouxeram sempre uma rosa.
39
Se dissesses, na partida,
fica... me escuta... Por mim,
mesmo com alma ferida,
eu teria dito sim.
40
Se encontras caminhos falhos
na busca do amor de alguém,
o coração tem atalhos
que nenhum mapa contém.
41
Se essa estrada que foi nossa
dividiu-se, não destruas
nenhum atalho que possa
juntar outra vez, as duas...
42
Seja em palácio ou favela,
brigam, mas amam também,
e se há feijão na panela
toda família vai bem.
43
Tiro, escondo, torno a pô-lo
na carteira, e ninguém vê
que esse retrato é um consolo
que eu guardo, não sei por quê...
44
Tua sombra é um sonho triste
num grotão sem claridade
onde uma fonte resiste
molhando o chão de saudade.
45
Uma ficou sobre a mesa:
a dos sós... nem nome tinha...
E eu descobri, com tristeza,
que essa medalha era a minha!
46
Vai o rei para o combate,
cercado de proteção
e, às vezes, o xeque-mate
é dado por um peão.
47
Vai o trambiqueiro à igreja
e reza, benzendo os crentes:
Que a boa fé sempre esteja
ao lado dos meus clientes...
48
Vens de volta, tão suave,
vem, procura a mesma porta,
se o tempo entortou a chave,
o coração desentorta.
49
Vivi tantos temporais,
uns reais, outros à toa,
que hoje quando dão sinais,
eu vejo apenas garoa.

segunda-feira, 24 de abril de 2017

Humberto Del Maestro (Vitória/ES)

1
A chuva cessou há pouco, 
mas o frio continua... 
Grita o vento como um louco 
por entre os becos da rua. 
2
Acordo, olho o céu e vejo 
que a manhã imaculada 
traz os perfumes de um beijo 
que roubou da madrugada. 
3
A minha casa é pequena, 
e embora tal restrição, 
nela reside serena 
minha doce inspiração. 
4
Amo a minha biblioteca, 
doce nave da ilusão, 
pois nela sigo até Meca 
ou molho os pés no Jordão. 
5
Ando em busca da centelha 
do teu beijo de esplendor 
e da papoula vermelha 
que escondes com teu pudor. 
6
Ao longe, de madrugada, 
por sobre o mar terno e lindo, 
a pequenina jangada 
parece a lua dormindo. 
7
As nossas línguas macias, 
em carícias muito loucas, 
parecem duas enguias 
disputando em nossas bocas. 
8
A tarde se abrasa em cores 
e lentamente desmaia. 
O céu, pintado de flores, 
lembra uma enorme lacraia. 
9
A tarde triste adormece. 
Estrelas piscam em cruz... 
Ao longe, a lua parece 
delgada foice de luz. 
10
A trova é um poema grácil, 
que surge de um mundo etéreo: 
- Para quem sabe é bem fácil. 
- Pra quem não sabe é um mistério. 
11
Brilha o céu como turquesa 
e o nascente é de romã… 
Nunca vi tanta beleza 
surgindo assim, na manhã. 
12
Chego a pensar que sou forte, 
vendo a velhice chegar, 
pois mesmo perto da morte 
consigo ainda sonhar. 
13
Cresci buscando esperança, 
nada achei e foi fatal. 
E quantas deixei, criança, 
brincando no meu quintal. 
14
De noite durmo e desperto... 
E, nesse doce vaivém, 
a infância chega tão perto 
que escuto apitos do trem. 
15
De tudo quanto me assiste, 
neste mundo miserando, 
nada me fala mais triste 
do que a velhice chegando. 
16
É frio, a noite descansa; 
o espaço é vasto e medonho. 
De repente, a lua mansa 
surge nos braços de um sonho. 
17
É noite calma de lua. 
Os ventos, em rodopios, 
são violinos na rua 
tocando valsas nos fios. 
18
Escondes mito e bonança 
na aparente timidez. 
Tens a graça e a temperança 
de um gatinho siamês. 
19
Essa mancha exígua e preta, 
no seu colo alvo e desnudo, 
lembra frágil borboleta 
toda feita de veludo. 
20
Fico olhando o teu aprumo. 
És linda e jovem demais... 
E eu sou um barco sem rumo, 
sem mais direito ao teu cais. 
21
Inefável labareda, 
a borboleta a voar 
parece um lenço de seda 
que um anjo esqueceu no ar. 
22
Meditando em meu cansaço 
não me entristeço nem rio... 
os troféus do meu fracasso 
valorizam meu vazio. 
23
Menino ainda acredito, 
olhando o céu com minúcia, 
que as estrelas do infinito 
sejam mimos de pelúcia. 
24
Meus versos feitos de sedas, 
do mais puro tom lilás, 
lembram calmas alamedas 
em tardes cheias de paz. 
25
Minha porta, que era arguta, 
de repente ensandeceu. 
Qualquer toque que ela escuta, 
julga logo ser o seu. 
26
Na doce tarde de outono, 
ruflam brisas em farol. 
As nuvens louras, sem dono, 
lembram novelos de sol. 
27
Na estrada que compartilho, 
meu coração, aos pedaços, 
lembra a mãe que já sem filho 
nina a solidão nos braços. 
28
Nasci na vida tristonho 
e vou por ela tão sério, 
que é por isso que o meu sonho 
tem as marcas de um cautério. 
29
Noite linda. O céu aberto 
faz-se de suave emoção. 
A lua chegou tão perto 
que eu quase a peguei na mão. 
30
Numa batalha renhida, 
vou lutar até o fim, 
pois quero sair da vida 
muito melhor do que vim. 
31
O arquiteto faz o traço, 
seu trabalho é no nanquim. 
Eu vivo as trovas que faço, 
que elas são partes de mim. 
32
O dia já nasce lindo. 
Passam ventos frios, nus. 
A manhã acorda rindo 
num escândalo de luz. 
33
Olhos brandos, mãos que espargem 
sorrisos como troféu... 
Pelo que os filhos lhe fazem 
as mães merecem o céu. 
34
O menino que era sonho 
de alma da cor do marfim, 
não sei mais onde é que o ponho, 
depois que cresceu em mim. 
35
O tempo amassou meu rosto. 
Não doeu, foi devagar... 
Mas as mágoas e o desgosto 
como é que custam passar. 
36
Pai querido, não morreste, 
que a morte nos lembra um fim 
e tudo aquilo em que creste 
anda a viver dentro em mim. 
37
Passa o vento num arrulho. 
A noite é fria lá fora. 
Como é gostoso o barulho 
da chuva caindo agora. 
38
Pelas manhãs de bonança, 
junto à brisa que flutua, 
borboletas são crianças, 
brincando alegres na rua. 
39
Penso ainda ser menino, 
correndo à toa na rua, 
empinando, sem destino, 
a branca raia da lua. 
40
Pressinto estar de partida 
e o mistério me seduz. 
Se fecho os olhos na vida 
acordo em mimos de luz. 
41
Que bom ficarmos juntinhos, 
distantes de um novo adeus, 
pois vejo nos seus olhinhos 
todo o carinho de Deus. 
42
Quero as minhas tardes feitas 
de luzes em algazarras; 
cheias de cores perfeitas, 
com festivais de cigarras. 
43
Saudade é dor muito estranha, 
toca no peito tão fundo 
que sinto que a minha entranha 
abriga as dores do mundo. 
44
Saudoso comprei passagem 
de retorno à minha infância. 
Mas como seguir viagem 
se eu nem sei mais a distância? 
45
Tem encanto, tem magia 
minha pequena janela, 
que ao abri-la a cada dia 
eu vejo a vida mais bela. 
46
Trabalho, sofro, padeço 
carregando a minha cruz, 
para ver se pago o preço 
desta roupagem de luz. 
47
Tudo se foi da lembrança... 
E do nosso antigo enredo 
nem mais a marca da aliança 
se acha gravada em meu dedo. 
48
Um doce aroma flutua 
nesta noite de ateneu 
e há tanta paz pela rua 
que eu penso que o céu desceu. 
49
Um gesto só, um arranjo, 
um traço apenas de acuro 
e acabarás sendo o anjo 
que em minhas preces procuro. 
50
Um remorso me espezinha 
se ponho, com aflição, 
no seu corpo de andorinha 
meus olhos de gavião. 
51
Veio Deus. Do caos agreste, 
ergueu o espaço sem fim. 
Porém tu bem mais fizeste 
do nada que havia em mim. 
52
Vitória: – um colar de ilhas! 
Cantar-te, com que talento?! 
Já bastam as maravilhas 
que escuto na voz do vento.

domingo, 23 de abril de 2017

Giselda de Medeiros Albuquerque (Fortaleza/CE)

1
Aprendi, na tua ausência,
uma lição ponderada:
– que a espera, com paciência,
torna mais breve a chegada.
2
As trovas são diamantes
que certo ourives, um dia,
com suas mãos operantes,
cravou no anel da poesia.
3
Cem anos da abolição
e o negro sofre a desgraça
de acorrentar-se à prisão
do preconceito da raça!
4
Chove a cântaros... e o frio
cai sobre tudo, por fim...
E, enchendo este meu vazio,
chovem saudades em mim...
5
É carnaval… e em meu peito
qual um sagaz folião,
brinca o meu sonho desfeito
nas alas da solidão…
6
É o mais belo panorama
e de Deus o melhor verso
o sol ressurgindo em chama,
banhando de ouro o universo.
7
Essas rugas que há no rosto,
mostrando a idade inclemente,
são rumos onde o desgosto
caminha, pisando a gente.
8
Esse gemido tristonho
das ondas, sempre a chorar,
é a voz queixosa de um sonho
preso nas conchas do mar!
9
Felicidade... momentos
de emoções transcendentais,
que se vão na asa dos ventos
e não voltam nunca mais!
10
Lançada a sorte! Em verdade,
eu parti... Mares medonhos!...
E, no Porto da Saudade,
fui ancorar com meus sonhos…
11
Leu tanto amor… e, no entanto,
sozinha, a cigana, à morte,
convive com o desencanto
de não ler a própria sorte!…
12
Não deixes preto o teu céu...
Vê que as grandes tempestades
espalham sombras ao léu,
mas vêm, depois, claridades.
13
Nesta existência sofrida, 
triste certeza me invade: 
– o sonho ardendo na vida, 
e a vida a arder na saudade.
14
O teu adeus, mesmo em sonho,
me aniquila de tal sorte
que, estando viva, suponho
estar nos braços da morte!
15
Por te amar tão loucamente,
fui-me tornando um palhaço,
fazendo rir tanta gente
às custas do meu fracasso.
16
Por um momento de sonho,
que dure uma eternidade,
darei tudo e não me oponho
a viver só da saudade.
17
Ri, palhaço, que o teu riso
vai à dor dar acolhida,
transformando em paraíso
teu picadeiro da vida.
18
Se a noite vem, com azedume,
vestindo de preto o céu,
que sejas tu, vagalume,
e espalhes luz a granel.
19
Sê como o mar, grandioso,
cujo esplendor estonteia,
mas, humilde e generoso,
vem bordar rendas na areia!
20
Se vires um tom de escuro
na trilha dos rumos teus,
não temas, e vai seguro,
que é a sombra da mão de Deus.
21
Sublime, aquele momento
em que o poeta, risonho,
põe asas no pensamento
e voa, buscando o sonho.
22
Tenta esconder o teu pranto,
às frustrações, ao desgosto,
pois não há maior encanto
que mostrar a paz no rosto.
23
Teu olhar, por sorte, às águas,
sombra nenhuma deixou,
no entanto deixou-me mágoas
nesta sombra que hoje eu sou!
24
Teus olhos, ardentes círios,
meus dias tornam risonhos,
e tuas mãos, brancos lírios,
vão modelando meus sonhos.
25
Vasculhando meu passado,
encontrei nele, tristonho,
teu retrato empoeirado
na gaveta do meu sonho.
26
Vencendo todo o cansaço,
decerto gargalharei,
pois hoje sou um palhaço
dos sonhos que não sonhei.

sábado, 22 de abril de 2017

Eduardo Toledo


1
Acalme a ira em seu sangue 
e as injustiças suporte, 
pois a ofensa é um bumerangue 
que sempre volta mais forte! 
2
A fé, de crenças tamanhas, 
é um rio largo e bendito 
que vai transpondo montanhas 
e deságua no infinito! 
3
Ainda vejo da varanda, 
em frente à Igreja Matriz, 
o meu pai regendo a banda 
e a praça inteira feliz! 
4
A mentira mais fingida 
que aprendi, quando criança, 
foi ouvir que pela vida 
quem espera sempre alcança. 
5
Ao devolver minhas cartas, 
o carteiro nem sabia 
que, além de saudades fartas, 
os meus sonhos devolvia! 
6
A saudade se embaraça 
e a paixão se intensifica... 
- Não pelo instante que passa, 
mas pelo instante que fica! 
7
A vingança não me agride, 
pois tenho de prontidão 
as armas para o revide: 
- o entendimento e o perdão! 
8
Bate a neblina... Em meu quarto, 
na solidão que me invade, 
a saudade inventa um parto... 
e nasce uma outra saudade! 
9
Corroendo o coração 
e a cabeça endoidecendo, 
o ciúme é a sensação 
do que se vê... não se vendo! 
10
Durmo tranquila e feliz 
na madrugada sem lei, 
quando meu filho entra e diz: 
- A bênção, mãe, eu cheguei!!! 
11
Em minha filosofia 
o amor é um barco ao relento: 
- soberbo na calmaria... 
- e incauto à fúria do vento!!! 
12
Em pouco mais que um segundo, 
e sem quaisquer cantilenas, 
a trova canta este mundo 
em quatro versos apenas! 
13
Meu pai, que venero tanto, 
e não sai dos sonhos meus, 
foi muito mais do que um santo, 
foi cá na Terra o meu Deus! 
14
Minha assanhada vizinha, 
enrugada e sem calor, 
parece um velho "fusquinha" 
já "rateando" o motor. 
15
Minhas saudades, no estágio 
de tantos sonhos em vão, 
até hoje pagam ágio 
no guichê da solidão! 
16
Não te rendas nunca à dor, 
se o teu bem tem rumo incerto, 
pois, muitas vezes, no amor, 
esse longe é muito perto! 
17
Na viagem da ilusão, 
pela tarde azul e morna, 
vivo a esperar na estação 
um trem que nunca retorna! 
18
Neném... Zé Gordo... Tuinha... 
Zeca saci... (Que distância!) 
- Cadê a turma que eu tinha 
na rua da minha infância"? 
19
No engenho do desencanto 
vou moendo a soledade 
e destilando o meu pranto 
no alambique da saudade! 
20
No leilão do teu amor, 
se a prenda for um romance, 
eu pago qualquer penhor 
e cubro o último lance! 
21
No trem da vida prossigo 
e, à luz da terceira idade, 
eu vou levando comigo 
um vagão só de saudade! 
22
No verão, alguns maridos 
caem nos blocos da cidade... 
Pintam lábios, põem vestidos 
e assumem a outra metade! 
23
O homem conquista e arrebanha 
mais altura e põe-se em pé, 
quando desce da "montanha" 
e professa a sua fé!!! 
24
O inverno fecunda o chão 
com sêmens de orvalho e espera 
as flores que brotarão 
do ventre da primavera! 
25
O medo que me intimida, 
ante o terror e o poder, 
é o medo da própria vida 
que não se pode viver. 
26
O meu sonho misantropo, 
deslizando na subida, 
até hoje busca o topo 
do pau-de-sebo da vida! 
27
O nosso amor, cuja essência 
é uma volúpia banal, 
parece até reticência 
com ar de ponto final! 
28
"O que é o amor?" me perguntas, 
e, em coro, os anjos entoam: 
"são duas pessoas juntas 
que se amam e se perdoam!” 
29
Os meus sonhos vão ao léu, 
pelas asas da ilusão... 
- Plantando flores no céu... 
- Colhendo estrelas no chão! 
30
O sonho que me incendeia 
à luz da terceira idade 
parece uma lua cheia 
no infinito da saudade! 
31
Por mais que eu galgue as montanhas 
dos sonhos, dos ideais, 
vem uma voz das entranhas 
e me ordena: "SUBA MAIS"!!! 
32
Por ser caboclo do mato, 
de capina a vida inteira, 
meu mundo tem o formato 
de uma roça sem fronteira! 
33
Recordações na parede, 
cacos de sonhos no chão 
e o passado, numa rede, 
embalando a solidão! 
34
Sua história... seus desterros... 
Minas, de formas Gerais, 
apesar de muitos erros 
nos deu acertos demais! 
35
Tendo a paixão como escolta 
e o coração em sentido, 
saudade é um sonho que volta, 
sem que nunca tenha ido! 
36
Um aroma diferente 
envolve a terceira idade: 
– é quando o olfato da gente 
sente o cheiro da saudade! 
37
Vaga o meu sonho ao luar 
num dilema permanente: 
- se pesca a estrela-do-mar... 
- se colhe a estrela cadente!!!

Lairton Trovão de Andrade (Descontraindo em versos)

01. Destrua a melancolia, pois a vida se renova! Contra a tristeza, Maria, beba chazinho de trova! 02. O plagiário é caricato que no mundo s...