Não temo o mar que me nega
ser mais branda a travessia.
Temo sim, a mente cega
que me bloqueia a ousadia!
- - - - - -
Não temo quedas, barreiras,
por mais que a tristeza insista.
Águas que são cachoeiras
não tem lodo que resista!
- - - - - -
Nas serestas da lembrança
onde o orvalho enfeita a tela,
a minha ilusão te alcança,
mas a razão diz:- Cautela!!!
- - - - - -
Nesta espera em que me farto
só dispenso a nostalgia
é quando a porta do quarto
tua chegada anuncia!
- - - - - -
Neste teatro que há em mim,
do meu papel não lamento.
Sem saber qual é meu fim
enceno o final que invento.
- - - - - -
No espaço, brilhando inquieta,
Cadente estrela me induz
a pensar que algum poeta
faz no céu versos de luz.
- - - - - -
No lar que me fez honrado
ante os conceitos de espaço,
o respeito era sagrado
mesmo que o pão fosse escasso.
- - - - - -
Nos meus embates medonhos
sempre enfrento os desafios,
quando a vida tece sonhos
e o tempo desfaz os fios.
- - - - - -
Nossas almas parecidas,
nossos sonhos se irmanando,
eu e tu, vidas vividas,
tarde demais se encontrando.
- - - - - -
Num cenário à luz de vela,
papai repassando a lida
deixou-me a lição mais bela
encenando a própria vida.
- - - - - -
Num jogo da fantasia
entre a loucura e a razão,
vislumbro na cama fria
teu corpo que busco, em vão.
- - - - - -
Os meus desejos de agora,
juntei-os, pus no correio:
(destino, Natais de outrora),
mas a resposta não veio
- - - - - -
O trovador finge tanto
que ao cantar a própria dor,
finge que a dor no entanto
é de um outro trovador.
- - - - - -
Ousar não é ser valente
ao buscar gloria e poder.
Ousadia é quando a gente
humaniza o nosso ser!
- - - - - -
Para ter felicidade,
ao buscá-la eu pressuponho,
que seja qual for a idade
felicidade é ter sonho.
- - - - - -
Por mais que o orgulho insista
peço a Deus a quem me entrego
que nas horas da conquista
eu saiba despir meu ego.
- - - - - -
Por medo meu coração
fechou-se e ainda pôs trave,
mas agora outra paixão
bate à porta e quer a chave.
- - - - - -
Quando a lua me abre as frestas
das lembranças que são tuas,
eu choro as velhas serestas
feitas à luz de outras luas!
- - - - - -
Quando deixei minha terra,
jurei e cumpri a jura,
que venceria esta guerra
entre o sertão e a cultura!
- - - - - -
Quando uma ofensa me oprime
em silêncio enfrento tudo.
Qualquer grito se redime
ante meu protesto mudo.
- - - - - -
Queres chamar-me de amigo,
mas teu olhar traidor
é a frase que eu mais bendigo
das frases mudas do amor
- - - - - -
Resisto, mas me afrouxando,
revogo a minha sentença.
Quem ama mesmo sangrando
perdoa e renova a crença.
- - - - - -
Retida além do horizonte
onde a razão se esvazia,
dos sonhos ergo uma ponte
e prossigo a travessia.
- - - - - -
Roxa ou preta quando antiga,
mas rubra se a dor maltrata.
Por isso na há quem diga
da saudade a cor exata.
- - - - - -
Se a porta é larga, desvio,
sem luta não tem vitória.
Porta estreita é o desafio
de quem vence e faz história!
- - - - - -
Sem ter fortuna aparente,
sob a luz de um lampião
fui bem mais rica e mais gente
naquela casa de chão.
- - - - - -
Se o homem abaixasse a fronte
com fé, respeito, humildade,
seria a Terra uma ponte
entre Deus e a humanidade.
- - - - - -
Seria a paz mais presente
e o porvir menos incerto,
se nas mãos do adolescente
sempre houvesse um livro aberto.
- - - - - -
Ser mãe é perpetuar
a vida em seu seguimento
conjugando o verbo AMAR
seja qual for o momento.
- - - - - -
Sozinha, num desvario,
sem concretude, meus braços,
traçam, sobre um leito frio
o perfil dos teus abraços.
- - - - - -
Tiro a máscara e ouço aflita,
de um mar de farsas sem fim,
meu outro eu que ainda grita
por vida dentro de mim.
- - - - - -
Trazendo o filho nos braços,
ante a dor ou alegria
toda mãe possui os traços
da Virgem Santa Maria!
- - - - - -
Velha casa, sonho alado
que a saudade hoje remonta
para mostrar meu passado
brincando de faz de conta.
Fonte:
Site de Rita Mourão
https://versosderita.weebly.com/trovas-premiadas.html
quinta-feira, 21 de maio de 2020
Rita Mourão (Trovas Premiadas) II
quarta-feira, 20 de maio de 2020
Rita Mourão (Trovas Premiadas) I
Abro a porta do passado
e vejo em pleno apogeu,
um rosto alegre, animado,
teimando que o rosto é o meu.
- - - - - -
Abro a porta e a janela
do meu coração em festa
quando a manhã tagarela
põe voz na densa floresta
- - - - - -
Abro a porta, enxugo o pranto
e fico a esperar teus braços,
mas para o meu desencanto
os passos não são teus passos.
- - - - - -
Amanhece, o dia é lindo,
e o passaredo contente
faz festa ao sol, que sorrindo.
lá do céu contempla gente.
- - - - - -
A mulher que é mãe me encanta,
no lar, seja aonde for.
Pois sendo mãe ela é santa
sendo mulher é o AMOR.
- - - - - -
Ante a bandeira hasteada
revendo as lutas, conceitos,
o pobre sem pão, sem nada
pede à pátria os seus direitos.
- - - - - -
Buscando nosso poente,
vamos nós dois bem juntinhos
sem deixar que envolva a gente
a solidão dos caminhos.
- - - - - -
Busquei-O além do horizonte,
nas águas do mar sem fim,
mas curvando a minha fronte
senti Deus dentro de mim.
- - - - - -
Com as chaves da alvorada,
Deus que é poder e magia,
deixa a noite enclausurada
e abre as portas para o dia.
- - - - - -
Com ousadia me olhaste,
ousada eu correspondi.
Com loucura me abraçaste
e o resto eu juro, nem vi!
- - - - - -
Desbravando o chão mineiro,
com brio, amor e esperança,
de um pai humilde e guerreiro
me veio a maior herança!
- - - - - -
Deus ao criar as estrelas
zeloso cumpriu a meta,
mas para alguém descrevê-las
criou também o poeta.
- - - - - -
Escrevo, mas sou discreta,
me anulo, libero a mente
e deixo solto o poeta
que só fala o que ele sente.
- - - - - -
Este meu andar sisudo,
que modela a caminhada
já retrata quase tudo
que a vida transforma em nada!
- - - - - -
Eu juro, mas com loucura,
minha emoção num relance,
abre a porta, quebra a jura
e a ti concede outra chance.
- - - - - -
É um velho lar meu legado
onde o amor gerou bonança
e pôs um filho ao meu lado
multiplicando essa herança.
- - - - - -
Faça do livro, criança,
a rota dos sonhadores.
O livro é o barco que alcança
o porto dos vencedores.
- - - - - -
Felicidade, abre a porta
vem logo ressuscitar
minha esperança já morta
cansada de te esperar.
- - - - - -
Fortuna, uma velha aldeia
onde a minha mãe querida
sob a luz de uma candeia
me dava lições de vida.
- - - - - -
Fui juiz de alheios fatos
hoje a vida com razão
me faz réu dos mesmos atos
que aos outros neguei perdão.
- - - - - -
Julguei sem pensar que um dia
os anos réu me fizessem,
sem defesa à revelia,
nos bancos dos que envelhecem.
- - - - - -
Levada por fantasia
de um desejo inconsciente,
eu beijo na cama fria
as formas de um corpo ausente.
- - - - - -
Meu pai foi um homem pobre,
mas dentro do lar garanto
que na vida nenhum nobre
pela família fez tanto.
- - - - - -
Meus retalhos de esperança,
juntei-os, pus no correio.
( Destino, velha criança,)
mas a resposta não veio.
- - - - - -
Mineira com mil louvores,
Paulista por adoção,
dois estados, dois amores,
dividindo um coração.
- - - - - -
Minha casa é pequenina,
com janelas sem vidraça,
mas tem a luz genuína
que do céu me vem de graça.
- - - - - -
Minha saudade é concreta,
tem nome, tem residência,
foi luz que me fez poeta
mas hoje se faz ausência.
- - - - - -
Minha saudade em vigília
revive os velhos Natais,
das orações em família
que os anos não trazem mais.
- - - - - -
Na humilde escola do lar,
de um saber santo e prudente,
com lições do verbo amar
meu pai me fez ser mais gente.
- - - - - -
Na minha fé hoje intensa
repasso o tempo que avança.
Foi recompondo essa crença
que ainda tenho esperança.
- - - - - -
Não condeno a caminhada
culpo sim, meus passos falhos.
Foi bem larga a minha estrada
fui eu quem buscou atalhos.
- - - - - -
Não diga adeus por favor,
me deixa assim , iludida.
Quero pensar que este amor
não tem porta de saída.
- - - - - -
Não lamento o meu outrora,
nem choro uma dor vivida,
lamento sim, a demora
em pôr Deus em minha vida.
- - - - - -
Não lamento o meu passado,
nem mesmo o tempo me ofende.
Viver é um aprendizado
quem mais vive mais aprende.
- - - - - -
Não me curvo ante o fracasso
nem lamento as busca mortas,
na coragem dos meus passos
trago as chaves de outras portas
- - - - - -
Fonte:
Site de Rita Mourão
https://versosderita.weebly.com/trovas-premiadas.html
quinta-feira, 14 de maio de 2020
Antônio Sales (Paracuru/CE, 1868 - 1940, Fortaleza/CE)
- Vossa Excelência é a Verdade!
- Por quê? - Porque está tão nua!
- - - - - –
- A fealdade é um direito;
por isso ninguém a acusa.
Mas ser feia desse jeito...
Perdão: a senhora abusa!
- - - - - –
A opinião severíssima
te condena sem razão:
tu serias fidelíssima
se fosses... mulher de Adão.
- - - - - –
— As cobras que tem no anel,
certo médico alopata,
são, de certo, cascavel:
onde ele põe a mão, mata!
- - - - - –
(A um juiz)
não tem, neste mundo, a gêmea,
foi uma felicidade
não teres nascido fêmea...
- - - - - –
- E difícil que aconteça
dor de cabeça ela ter:
pode a dor aparecer,
mas não encontra cabeça...
- - - - - –
— Em certo escritor satírico,
de uma irreverência atroz,
nós achamos muito espírito...
quando não fala de nós.
- - - - - –
- Em tua genealogia
Fidalgo, vais longe... Até
que hás de chegar, algum dia,
ao Congo, Angola ou Guiné...
- - - - - –
Eu conheço um plumitivo*,
cheio de vaidade imensa,
que anda sempre pensativo
e apenas pensa que pensa.
- - - - - –
- "Não gosto de ouvir tolices!" -
exclamas, estomagado;
Para que não as ouvisses,
devias ficar calado.
- - - - - –
- Para que não te despraza**
ver gente má pela frente,
precisas primeiramente
não ter espelhos em casa...
- - - - - –
— Passa na estrada um camelo
e um corcunda palpitante
de alegria, disse ao vê-lo:
- "Mas que animal elegante!"
- - - - - –
- Vi um médico fardado...
Que perfeito matador:
quem escape do soldado,
não escapa do doutor...
________________________________
Notas:
* Despraza – do verbo desprazer.
** Plumitivo – escritor ou jornalista sem méritos.
Fonte:
R. Magalhães Junior. Antologia de humorismo e sátira. RJ: Bloch, 1998.
quarta-feira, 13 de maio de 2020
Alberto Isaías Ramires (Vila Velha/ES, 1924 - 2004, Rio de Janeiro/RJ)
A trova boa e perfeita
tem, na sua formação,
um pouco de pensamento,
um pouco de coração.
- - - - - –
Da vida, pelos caminhos,
uma coisa aprendi bem:
a roseira dá espinhos,
mas nos dá rosas, também…
- - - - - –
Falar mal da vida alheia
é coisa que não convém;
quem tem telhado de vidro
não fustiga o de ninguém…
- - - - - –
Juraste que eternamente
minha, só minha, serias.
Mas o teu "eternamente"
não foi além de dois dias...
- - - - - –
Lá se foi a meninice,
meu barquinho do papel,
minha ingênua peraltice,
meu doce Papai Noel...
- - - - - –
Não entendes meu desgosto,
mas aprende esta lição:
nem sempre pomos no rosto
as mágoas do coração.
- - - - - –
Num mundo triste e sisudo,
cheio de ódio e ambição,
do trabalho fiz escudo
e, da honradez, religião!
- - - - - –
O amor começa, meu bem,
num sorriso ou num olhar;
mas, por capricho, também,
assim pode terminar…
- - - - - –
Passam dias, meses, anos...
Quem na vida, nada alcança
deve sempre aos desenganos
antepor uma esperança.
- - - - - –
Por nascer pobre, o Divino
num gesto compensador,
despertou, em meu destino,
a lira de trovador…
- - - - - –
Quando eu morrer, por favor
coloquem na minha cova
um epitáfio de amor
escrito em forma de trova!
- - - - - –
Saudade - um berço vazio,
uma lágrima, uma dor;
coração sentindo frio
longe da chama do amor…
- - - - - –
Semeia por onde fores,
bondade, amor e carinho;
e transformarás em flores
as pedras do teu caminho.
- - - - - –
Sobre o Amor já se tem dito
muita coisa de valor;
mas bem poucos, acredito,
sabem mesmo o que é o Amor!
- - - - - –
Via-a rezando, contrita,
com os olhos fitos no céu.
Quanto pecado escondido
debaixo de um fino véu!...
- - - - - –
Vitória - Ilha do mel
que nos deslumbra e extasia.
Um pedacinho de céu
que é sonho, amor e poesia...
terça-feira, 12 de maio de 2020
Amaryllis Schloenbach
A lua fulge tristonha,
sozinha no céu imenso;
Minha alma na noite sonha
enquanto em teus olhos penso.
- - - - - –
— Coração, bates ligeiro,
até mudas de compasso,
se recordo o amor primeiro
ou se perto dele passo!
- - - - - –
— Coração, fonte de amor,
mostras a cada segundo
que em toda ilusão há dor,
nos destinos deste mundo!
- - - - - –
Espumas, ondas bravias,
soluça o oceano em revolta;
como ele sou (não sabias?)
quando aguardo tua volta.
- - - - - –
Este amor que é meu tormento
bate em casa abandonada...
Responde, na voz do vento,
somente o eco, mais nada!
- - - - - –
Este amor que eu acalento,
pelo qual estou perdida,
é meu canto e meu lamento,
minha morte e minha vida!
- - - - - –
Foste embora, certo dia;
fiquei magoada, a chorar...
Hoje sinto — quem diria? —
que foi sorte e não azar!
- - - - - -
Invejo a rosa tão linda,
que, sem ligar para a sorte,
a vida perfuma ainda,
altiva, à espera da morte!
- - - - - –
Já não posso refrear
esta paixão violenta,
que ruge mais do que o mar,
presa de rude tormenta!
- - - - - –
Morre a noite de repente.
Seu sangue cobre a amplidão,
e a aurora, triste e silente,
se ajoelha em oração.
- - - - - –
O fio do pensamento
vai tão longe e até parece
que, impelido pelo vento,
quer prender quem já me esquece!
- - - - - –
O orvalho, do céu liberto,
de uma flor se fez amante,
e em seu regaço entreaberto
pôs um límpido brilhante!
- - - - - –
Procura esquecer teu pranto
secando o pranto de alguém;
assim verás mais encanto
no encanto que a vida tem!
- - - - - –
Quando, no ocaso da vida,
um amor nos surpreende,
a existência agradecida
em nova chama se acende!
- - - - - –
Quero da rosa a existência,
sua beleza e frescor:
veludo toda, e essência,
para a colheita do amor.
- - - - - –
Relembro as tardes da infância,
olho a praia, escuto o vento...
Fica mais perto a distância
nas asas do pensamento...
- - - - - –
Se queres colher a paz,
não procures tão a esmo;
só pode tê-la quem traz
a paz dentro de si mesmo!
- - - - - –
Solitário, junto à margem
chora, saudoso, o salgueiro:
parecem vir da ramagem
as águas do rio inteiro!
- - - - - –
Sonho, palavra pequena,
porém, de grande valor:
faz a vida mais amena
e muito mais belo o amor!
- - - - - –
Um breve sonho de amor
— depois, ventura perdida —
é aquele doce amargor
em que se resume a vida.
- - - - - –
Viver num corpo sem alma
— eis o meu drama, porque
perdi minha paz e a calma
depois que perdi você.
Fontes:
– Aparício Fernandes (org.). Trovadores do Brasil. 2. Volume. RJ: Ed. Minerva,
– Revistas Virtual de Trovas “Trovia”
Lairton Trovão de Andrade (Descontraindo em versos)
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A rima é essencial na trova, e consiste na conformidade de sons de duas ou mais palavras, a partir da última vogal tônica . Assim, Mar ia ...
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